O idealismo na vida do empreendedor

O idealismo comporta-se ao longo de um dia como ao longo da vida. Quando acordo de manhã sou idealista e otimista. Vai tudo dar certo. Apetece-me encarar o mundo de frente. Mais um dia de trabalho esforçado mas compensador. Faço o que gosto e isso é um privilégio

A hora do chuveiro é o auge. Com a água a correr e ainda meio ensonado penso em todos os projetos, os que estão a decorrer e nos que (ainda) estão na gaveta, e acredito que têm tudo para resultar. É uma espécie de espírito de adolescência que acredito que será comum a todos os empreendedores e grande parte dos empresários.

Depois começa o dia, os pequenos-almoços dos miúdos, vestir e levar à escola. As ideias e tarefas fluem de tal forma que às vezes sinto o desperdício de não poder já estar a trabalhar. Quando não os levo eu à escola, às vezes há tempo para as notícias da manhã. Felizmente uma grande parte é sobre futebol, caso contrário podia haver um salto direto da adolescência para a velhice.

No escritório pela manhã começo por preparar o dia e até há (um bocadinho de) tempo para pensar. “Há isto, isto e isto para fazer. Qual é a melhor maneira? Qual é a pessoa indicada? Quem é que precisamos de envolver para isto dar certo?” Está tudo lá: gestão de equipas, envolvimento de stakeholders, pensamento estratégico.

Depois aparece o primeiro “biscate do dia”. É como aquele momento em que nos dizem pela primeira vez que “pareces mais novo” e percebemos que já não somos propriamente jovens. O tempo começa a ser utilizado para apagar fogos. O empreendedor é uma espécie de “faz-tudo” da empresa – e os planos para o dia começam a ficar comprometidos…

Uma tarefa que não gostamos é a primeira desculpa para ir ao Twitter ou ao Facebook, o início do fim do idealismo. 

O político que desviou, o terrorista que matou, a multinacional que arruinou. É como quem chega aos quarenta e muitos e percebe que afinal não conseguiu fazer nada do que tinha pensado para a sua vida até ser um quarentão. 

Mas ainda há luz ao fundo do túnel. Nós não somos assim, somos diferentes, estamos cá para mudar o paradigma e fazer um mundo melhor!

Tudo se torna mais sério quando de repente chegou a hora de almoço e percebo que, mais uma vez, não há tempo para fazer desporto. Com três filhos o início e o final do dia estão (e muito bem!) “ocupados”, portanto só resta o intervalo do meio-dia.

Comer qualquer coisa a correr porque de manhã, enquanto sonhava com otimismo esqueci-me de preparar o tupperware, e voltar para o PC, ou nem sequer de lá sair.

A tarde, já muito mais sóbria e realista, é passada com a sensação de “correr atrás do prejuízo”. É preciso recuperar o tempo perdido e limpar a lista de tarefas, com eficácia para ainda desfrutar do tempo com os miúdos antes de irem dormir. Nem um nem outro. A lista de tarefas cresce mais rápido do que a sua execução e cada vez mais sabe a “trabalho” em vez de prazer.

O dia acaba com o pensamento “Vale a pena esta luta? Se no fim de contas é cada um por si…”.

Felizmente o acordar de (quase) cada dia é igual ao anterior. Ou começava a trabalhar só de manhã.

PS: este texto começou a ser escrito de manhã, interrompido a meio do dia e concluído numa manhã, alguns dias depois.

Por Nuno Brito Jorge
CEO da Boa Energia

Publicado em: 13/05/2016 - 19:46:26
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