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Ninguém se demite em Portugal
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Ninguém se demite em Portugal
A maior parte dos portugueses, quando em boa hora chegam ao governo ou a lugares públicos de notoriedade, logo julgam que se lá estão é porque foram ungidos e, portanto, estão à margem da lei e da moral.
Volta e meia os governantes e titulares de cargos públicos vêem-se envolvidos em situações menos claras no nosso país. Uns não pagam impostos, outros justificam contratos milionários com os irmãos, outros aceitam viagens pagas por empresas privadas, outros metem cunhas para que os filhos tenham acesso à faculdade de medicina, outros alugam casas no estrangeiro à custa do Estado, etc., etc... O assunto faz parte do anedotário nacional. Já estamos todos habituados. Já sabemos que ninguém pede a demissão e mais, que os governos os protegem.
A razão pela qual ninguém em Portugal se sente moralmente obrigado a demitir-se quando pratica ilegalidades e até crimes tem uma explicação complexa. Tem certamente a ver com a nossa formação católica; quando alguém prevarica espera o perdão do público. Suponho que Antero do Quental que muito bem conhecia a questão me daria razão. E Max Weber ainda mais. O português arrepende-se, faz penitência, devolve o dinheiro e tudo fica bem. Logo afirma que actuou «com tranquilidade». A dele porque sabe que o apoiam e a dos outros porque sabe que o perdoam. Nos piores casos expia a culpa preso e regressa pronto para outra, mais forte e inocente do que nunca à espera da nossa indulgência, o coitado.
Nos países protestantes obviamente que não é assim. A culpa é uma realidade objectiva que lança sobre o culpado um opróbio que não é desculpável. Não há segundas oportunidades porque o arrependimento de nada vale e não há perdão. É nesta vida que prestamos contas e não depois. Cá não é assim. O luso tem sempre uma segunda oportunidade e mais; uma condenação é bem vista e até curriculum eleitoral. E o eleitorado é sempre magnânimo ao perdoar. É a prova de que o culpado se arrependeu e que, assim sendo, é mais humano do que era e sai fortalecido na sua estatura moral.
Uma das poucas personalidades políticas que pediu a demissão dos milhares que desde o 25 de Abril entraram no governo foi, que me lembre, um honestíssimo ministro socialista, já falecido, que se sentiu a tal obrigado por razões que nada tinham a ver com ele mas que incriminavam os seus filhos. Paz à sua alma.
A maior parte dos portugueses, quando em boa hora chegam ao governo ou a lugares públicos de notoriedade, logo julgam que se lá estão é porque foram ungidos e, portanto, estão à margem da lei e da moral. Não devem explicações a ninguém. Julgam-se predestinados para uma missão que os ilumina. Estão, portanto, tranquilos, como diz agora um secretário de Estado (ou subsecretário, é indiferente). Bem podem os melhores constitucionalistas do nosso país pregar-lhes direito e moral que o Governo não os ouvirá e os próprios ainda menos. É que em Portugal há arrependimento, mas não há vergonha.
E as viagens? Essas já estão no papo. E ninguém lhas tira. Desculpem lá... Demissão porquê? Estamos tranquilos.
00:05 h
Luiz Cabral de Moncada, Prof. de Direito e Advogado
Económico
Volta e meia os governantes e titulares de cargos públicos vêem-se envolvidos em situações menos claras no nosso país. Uns não pagam impostos, outros justificam contratos milionários com os irmãos, outros aceitam viagens pagas por empresas privadas, outros metem cunhas para que os filhos tenham acesso à faculdade de medicina, outros alugam casas no estrangeiro à custa do Estado, etc., etc... O assunto faz parte do anedotário nacional. Já estamos todos habituados. Já sabemos que ninguém pede a demissão e mais, que os governos os protegem.
A razão pela qual ninguém em Portugal se sente moralmente obrigado a demitir-se quando pratica ilegalidades e até crimes tem uma explicação complexa. Tem certamente a ver com a nossa formação católica; quando alguém prevarica espera o perdão do público. Suponho que Antero do Quental que muito bem conhecia a questão me daria razão. E Max Weber ainda mais. O português arrepende-se, faz penitência, devolve o dinheiro e tudo fica bem. Logo afirma que actuou «com tranquilidade». A dele porque sabe que o apoiam e a dos outros porque sabe que o perdoam. Nos piores casos expia a culpa preso e regressa pronto para outra, mais forte e inocente do que nunca à espera da nossa indulgência, o coitado.
Nos países protestantes obviamente que não é assim. A culpa é uma realidade objectiva que lança sobre o culpado um opróbio que não é desculpável. Não há segundas oportunidades porque o arrependimento de nada vale e não há perdão. É nesta vida que prestamos contas e não depois. Cá não é assim. O luso tem sempre uma segunda oportunidade e mais; uma condenação é bem vista e até curriculum eleitoral. E o eleitorado é sempre magnânimo ao perdoar. É a prova de que o culpado se arrependeu e que, assim sendo, é mais humano do que era e sai fortalecido na sua estatura moral.
Uma das poucas personalidades políticas que pediu a demissão dos milhares que desde o 25 de Abril entraram no governo foi, que me lembre, um honestíssimo ministro socialista, já falecido, que se sentiu a tal obrigado por razões que nada tinham a ver com ele mas que incriminavam os seus filhos. Paz à sua alma.
A maior parte dos portugueses, quando em boa hora chegam ao governo ou a lugares públicos de notoriedade, logo julgam que se lá estão é porque foram ungidos e, portanto, estão à margem da lei e da moral. Não devem explicações a ninguém. Julgam-se predestinados para uma missão que os ilumina. Estão, portanto, tranquilos, como diz agora um secretário de Estado (ou subsecretário, é indiferente). Bem podem os melhores constitucionalistas do nosso país pregar-lhes direito e moral que o Governo não os ouvirá e os próprios ainda menos. É que em Portugal há arrependimento, mas não há vergonha.
E as viagens? Essas já estão no papo. E ninguém lhas tira. Desculpem lá... Demissão porquê? Estamos tranquilos.
00:05 h
Luiz Cabral de Moncada, Prof. de Direito e Advogado
Económico
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