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Os livros que não lemos até ao fim
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Os livros que não lemos até ao fim
Há dias, ao almoço, um amigo contou-me que nestas férias de Verão leu finalmente as Memórias de Adriano, de Marguerite Yourcenar. No interior do seu exemplar encontrou um bilhete de camioneta antigo, dos tempos em que havia começado a ler o livro. Isso passou-se há uns 30 anos. Na altura, disse-me ele, era demasiado jovem para digerir aquelas páginas densas e eruditas. Assim, acabou por deixar a leitura a meio.
Achei curioso que a experiência de leitura dele tivesse algumas semelhanças com a minha. Mas achei ainda mais curioso o paralelo com o processo de escrita desse grande romance.
“Este livro foi concebido, depois escrito, completamente ou em parte, sob diversas formas, entre 1924 e 1929, dos 20 aos 25 anos. Todos esses manuscritos foram destruídos, e mereciam sê-lo”, revela a autora num conjunto de notas que aparece no final da edição portuguesa. O projecto seria retomado “várias vezes entre 1934 e 1939”. “Apesar de tudo era demasiado nova. Há livros a que só devemos abalançar-nos depois dos 40 anos”.
Em 1948, Yourcenar estava a queimar cartas antigas que já nada lhe diziam quando reparou numa cujo destinatário não conseguia identificar. Começava com estas palavras: “Meu caro Marco”. Ao aperceber-se de que o Marco era Marco Aurélio e o remetente um Adriano que ela própria imaginara, mergulhou de corpo e alma no romance que tinha começado em 1924, ou seja, 24 anos antes.
No caso das Memórias de Adriano, tanto eu como o meu amigo acabámos por levar a leitura a bom porto - talvez por pressentirmos que, apesar de não ser um livro fácil, valia a pena lê-lo até ao fim. E se vale... Mas há muitas outras leituras que ficam, como costumo dizer, em águas de bacalhau.
Talvez o recordista das 'falsas partidas' seja Ulisses, de James Joyce. Trata-se de um livro tão críptico e difícil que só conheço uma pessoa que o tenha lido integralmente. Joyce queria que os estudiosos e amantes de literatura dedicassem a vida inteira a decifrar a sua obra - e em parte conseguiu-o. Mas depois há todos os outros que, em vez da vida inteira, só lhe dedicam cinco minutos - o tempo suficiente para lerem a primeira página, perderem a paciência e perceberem que é inútil insistir.
Julgo que deve haver poucas coisas mais frustrantes para um autor do que os seus leitores não levarem as suas obras até ao fim. Porque acerca daqueles que nem abrem o livro, o escritor poderá sempre dizer: 'Não sabem o que perdem'. Mas os que já iniciaram a leitura, se não sabem exactamente, pelo menos fazem uma ideia do que poderiam encontrar a seguir. E não estão interessados. Aliás, não só acham que não vale a pena perder mais tempo, como deitam o tempo investido até aí pelo cano abaixo.
Creio, porém, que na maioria dos casos a decisão não é tomada de forma tão consciente. Já larguei a meio muitos livros que estava a achar interessantes, simplesmente porque entretanto surgiu outra leitura mais urgente - ou mais fácil - que 'atropelou' a anterior. E há obras que assim vão ficando uma semana, um mês, um ano, uma década, à espera. Numa espécie de limbo dos livros inacabados.
Idealmente, gostaria de terminar de os ler, um a um, e de deixar o assunto encerrado. Mas isso seria num cenário ideal. E, num cenário ideal, também não haveria livros chatos. Seriam todos tão estimulantes que ninguém se atreveria a largá-los antes de chegar à última página, à última linha, à última palavra.
José Cabrita Saraiva | 07/10/2014 14:53:36
SOL
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