Paulo Portas, o homem vestido de Canal do Panamá

Carlos Slim faltou a um jantar com Paulo Portas. Consta que por dois motivos. Por o homem mais rico do mundo achar que, se tivesse de ir a todos os jantares com todos os vice-primeiros-ministros de todos os países do mundo, não faria outra coisa. E por Paulo Portas se passear pelas Américas insuportavelmente vestido de Canal do Panamá

Caro Carlos Slim:

Sempre atento às viagens dos meus governantes, tomei conhecimento de que o caro Carlos não compareceu a um jantar promovido pelo ministro das Relações Exteriores do México por ocasião da visita de Paulo Portas, vice-primeiro--ministro de Portugal.

Jantar que, segundo alguns media portugueses, teria dois pontos altíssimos.

O abraço que Carlos Slim daria a Paulo Portas.

E o abraço que Paulo Portas daria a Carlos Slim.

Ambos para selar a manifestação de interesse do caríssimo Carlos pela PT e, mais genericamente, por Portugal.

Difundindo assim, por esse mundo fora, da Europa a Timor, o insuperável respeito que o altíssimo capital internacional tem por o laboratório de crescimento económico que é este País.

Carlos Slim, convidadíssimo, não compareceu.

Portugal ficou decepcionado.

O segundo maior partido da maioria que governa Portugal ficou decepcionado.

Eu fiquei decepcionado.

Pelo que ficámos, Portugal, o CDS e eu, mais empobrecidos.

Isto é, menos enriquecidos.

Percebe-se que o caríssimo Carlos não pode encontrar-se com todos os vice-primeiros-ministros de todos os países do mundo.

Não faria o Carlos outra coisa, a não ser estender, aos ditos, a mão.

Vá lá dois ou três dedos.

Ser o homem mais rico do mundo é, sabe-se, difícil.

Há, no entanto, aqui, caríssimo Carlos, uma coisa que não é facilmente descartável.

Por nós, portugueses.

É que, deste lado do episódio do jantar, está uma entidade que, vai para mil anos, dá pelo nome de Portugal.

Sabendo-se, decerto, mesmo nas altas Américas, que esta nossa nação teve, por soberanos, pelo menos, dois émulos seus, caro Carlos.

D. Manuel, o Venturoso.

E D. João V, o Magnânimo.

Que estavam também nesse jantar, representados pelo vice-primeiro-ministro português.

Contestará o meu caro Carlos que o nome que lhe anunciaram não era nem Manuel nem João.

Sequer António Augusto Carvalho Monteiro, o Monteiro dos Milhões.

Mas o de um Paulo etc. e tal.

Ora, sendo esse mesmo Paulo o vice- -primeiro-ministro deste País, na circunstância, Portugal era técnica, protocolarmente, ele.

D. Manuel era ele.

D. João V era ele.

O Monteiro dos Milhões era ele.

Perdeu o meu caro Carlos, com a sua não comparência, o espectáculo do ministro português levantando-se para ir a correr lá dentro enfiar trajos e mais trajos, com a ajuda de Filipe La Feria. E regressar à mesa, trajando, sucessivamente, dos pés à cabeça, de dois grandes reis e de um nababo do seu país.

Compreende-se que Paulo Portas não tenha querido dramatizar a não comparência do meu caro Carlos.

Limitando-se a dizer esta coisa sublime:

- Carlos Slim não esteve no jantar, por acaso!

O que é a admissão, política, de que ele, Paulo Portas, por acaso esteve!

Bem como D. Manuel, D. João V, e o Monteiro dos Milhões.

A crónica e o cronista são, porém, os lugares e os desempenhos que não têm de ser cúmplices de um silêncio mediático sobre este - pior que desencontro -, não-encontro.

Silêncio de alguns media, antes muito ajudados pelo gabinete do vice-primeiro-ministro, ansioso por capitalizar politicamente este meio dobrar de joelho do altíssimo capital planetário perante o vice-primeiro-ministro português.

Consta, porém, que o caro Carlos terá tido um motivo muito forte para não comparecer.

Dois motivos muito fortes.

O ter sido informado de que o vice-primeiro-ministro português se preparava para lhe estender, a ele, Carlos Slim!, dois, três dedos displicentes!

E o ter visto, na imprensa matutina da Cidade do México, fotografias do vice-primeiro-ministro português que o levaram a soltar, fortíssimo, ao pequeno almoço:

- Un hombre vestido de Canal de Panama, jamás!

Por Artur Portela
publicado em 10 Nov 2014 - 05:00