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Reino Unido: Agarrar os jovens antes que mergulhem no Terrorismo
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Reino Unido: Agarrar os jovens antes que mergulhem no Terrorismo
Junto à mesquita de Walthamstow, em Londres, existe um centro de juventude cujo nome se tornou conhecido em todo o país: a Fundação Active Change, ou Mudança Ativa. Trata-se de uma associação que combate o fenómeno da radicalização entre os jovens britânicos. É uma espécie de refúgio para muitos deles, como Javid Khan. “Eles ajudaram à minha educação, à minha vida social, a entrar para a universidade, em tudo. Protegeram-me daqueles que andam a recrutar para os grupos extremistas”, conta-nos.
"Lembro-me de estar a conversar com pessoas, normalmente, a falar de como organizar um ataque terrorista em Londres."
Hanif Qadir tem trabalhado com este pai, que tem transmitido ao filho mensagens que desmistificam a interpretação que o Daesh faz do Islão. “Conseguimos ultrapassar uma etapa muito importante neste caso. Conseguimos que este indíviduo comece a olhar para a religião de outra maneira. Se tivermos paciência, se conseguirmos formas de passar informações às pessoas, para as incentivar a pensar por elas próprias, as coisas podem mesmo mudar”, considera o responsável desta fundação.
Qadir fala com conhecimento de causa. Em 2002, partiu para o Afeganistão para se juntar à Al-Qaeda. Mas a violência exercida no seio do grupo despertou-o para outra realidade. Criou esta associação em 2003. Após os atentados em Londres em 2005, foi um dos primeiros a criar programas específicos para prevenir a radicalização entre os mais jovens.
O terrorismo visto de dentro
A capital britânica tornou-se num dos principais pontos de recrutamento do autoproclamado Estado Islâmico na Europa. Como é que tudo isto se processa? Adam Deen, antigo membro do movimento extremista Al-Muhajiroun, fala-nos agora enquanto especialista em terrorismo: “Num mundo onde as pessoas se sentem cada vez mais inseguras, a mensagem que o Daesh passa acaba por ser reconfortante. Eles simplificam as coisas para dividir o mundo entre o Bem e o Mal. Eu conheci alguns desses extremistas. Para mim, no que dizia respeito à fé, eles eram a autoridade. Fui embarcado numa viagem pelo extremismo. Tornou-se algo de normal para mim. Lembro-me de estar a conversar com pessoas, normalmente, a falar de como organizar um ataque terrorista em Londres. Quando olho para trás, penso: ‘o que é que eu tinha na cabeça?’ Achava que era tudo lógico. O Ocidente estava a atacar os muçulmanos e era o nosso inimigo. Nós temos de cortar este fluxo rumo ao extremismo. E, para isso, é necessária uma reforma teológica. A forma como se entende o Islão, a visão do mundo através da lente islâmica, tem de mudar.”
Rashad Ali, um outro ex-membro de uma organização radical, também partilhou connosco a sua experiência. “Assim que começamos a perceber que a ideologia deles é vazia, que a sua política nada tem a ver com a realidade, que a narrativa religiosa serve apenas para justificar o extremismo das suas posições, podemos destrinçar as verdadeiras convicções religiosas. E é aí que percebemos que têm uma ideologia completamente amoral. Foi isso que me permitiu a mim e a outros cortar as amarras. Os ingredientes que utilizam para seduzir as pessoas são os mesmos que servem para os deixar”, afirma.
Os que regressam e os que não chegaram a partir
Os serviços de segurança britânicos já identificaram cerca de quatro mil islamistas radicais no país considerados potencialmente perigosos. Destes, cerca de 20% são alvo de vigilância especial. Uma medida que muitos criticam, denunciando o agravamento da estigmatização contra a comunidade muçulmana.
Ainda mais controversa é a identificação obrigatória nas escolas de alunos que possam representar um risco. A IQRA, uma escola islâmica de Slough, nos arredores de Londres, pretende reforçar o diálogo com os estudantes. Zafar Ali tem a missão de preparar os professores para o fazer, aqui e noutras escolas.
“Preparamos os professores para que aprendam a sinalizar os problemas, como agir, como não agir. Recentemente, houve uma criança numa escola primária que, depois das aulas, disse: ‘Louvado seja Alá’. A professora achou que era uma ameaça terrorista e chamou a polícia. Tanto o aluno, como os pais, foram interrogados. Hoje em dia, o ambiente é tal que muitos jovens acham que se expressarem os seus pontos de vista, vão ficar marcados, vão ser acusados de extremismo. Isso é perigoso, porque leva as pessoas à clandestinidade”, salienta.
Ao que tudo indica, o Daesh já integrou mais de 750 cidadãos britânicos nas suas fileiras. O Ministério do Interior britânico calcula que 60% deles tenham regressado a casa.
Muitos jovens são abordados, através das redes sociais, pelo autodenominado Estado Islâmico. O projeto Football for Unity pretende chamá-los para o desporto de forma a, justamente, criar um sentimento de unidade e pertença entre os mais vulneráveis. “Temos muçulmanos, temos judeus, temos católicos, temos jovens doutras confissões religiosas, hindus ou sikhs. Através do futebol, temo-los ajudado a evitar a radicalização. É uma forma formidável de juntar culturas diferentes. Explicamos-lhes o que é um Estado de direito, quais são os valores britânicos… Não importa de onde vêm. A sua identidade será sempre britânica”, diz Shamender Talwar, um dos fundadores do projeto.
Amina esteve prestes a partir para a Síria. Mas não quer abordar esse período específico. No entanto, fala-nos do apoio que sentiu quando chegou ao futebol. “Fez-me sentir que pertenço a algum lado. Os jovens sentem muitas vezes que estão desenquadrados, que têm de se revoltar ou algo assim. Mas a verdade é que nós só precisamos de alguém que nos pegue na mão e diga: ‘estamos contigo, estamos aqui para o que der e vier.’ E é isso que esta equipa nos dá. Deu-nos um sítio para onde ir. É quase uma família”, diz-nos.
Ao todo, o Daesh já terá recrutado entre 5 mil e 7 mil europeus. Hanif Qadir não hesita em dizer que a ofensiva militar internacional na Síria só vai piorar este fenómeno: “O grupo Estado Islâmico, a Al-Qaeda, todos os movimentos extremistas sabem qual é o verdadeiro campo de batalha. O problema é que os nossos líderes políticos não. E, por isso, cometem os mesmos erros vezes sem conta. O resultado é que, desde 2002, o terrorismo não pára de crescer. Nós devíamos estar a lutar no coração e na consciência das pessoas. Nas nossas comunidades, nas instituições. É aí que se desenrola a guerra, não é nas campanhas militares. Porque aí matamos os terroristas, mas não as suas ideias.”
Com a contribuição de Valérie Gauriat | Com NUNO PRUDêNCIO
Produzido por Valérie Gauriat
04/01 12:54 CET | updated 0-1:31 mn ago
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