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Não offshores por mim
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Não offshores por mim
O que de pior pode acontecer na forma como olhamos para o escândalo dos "Documentos do Panamá" é a tentação de acharmos que nada daquilo nos diz respeito. Que não há, nos mais de 11 milhões de papéis investigados por um consórcio internacional de jornalistas, uma revelação de que já não suspeitássemos. Não nos iludamos: o problema é nosso. Ainda que a estupefação inicial vá dando lugar à condescendência. Porque, bem vistas as coisas, está na natureza dos ricos sem escrúpulos, dos políticos corruptos e dos criminosos de primeira linha esconderem as fortunas e fugirem aos impostos. Porque a discussão sobre o fim das offshore é tão pertinente quão cansativa. Porque a origem do mal está identificada há tempo suficiente para já o terem extirpado. Houvesse vontade. Porque ninguém minimamente informado tem a ingenuidade de pensar que este abalo no alto-mar da finança vai provocar um tsunami de larga escala que regenera tudo à sua passagem.
Ainda assim, o problema é nosso. O problema é dos que vivem nos mais de 200 países ou territórios que os clientes da Mossack Fonseca usaram como morada para alimentar um esquema internacional de sem-vergonhice com sede no Panamá. Apenas um dos 60 refúgios fiscais que a globalização ajudou a florescer. A mesma globalização que, paradoxalmente, permite que o capital e os bens de 1% dos mais ricos (cuja fortuna supera a de todos os restantes) possam circular livremente sob o anonimato fiscal, mas que não aplica a mesma benesse aos restantes 99%.
Sim, o problema é nosso. Aquele dinheiro que não pagou impostos podia ser gasto nos nossos hospitais, nas nossas escolas e nos nossos tribunais. Aquele dinheiro que não pagou impostos é o mesmo que, sob a forma de branqueamento, ocultação de operações financeiras e demais expedientes, levou à ruína do BES, do BPP e do BPN. Pagos por quem nós sabemos. Aquele dinheiro esteve na génese da "Operação Furacão" e "Monte Branco". Foi, enfim, esse mesmo dinheiro que serviu para pagar "comissões" da venda dos submarinos a Portugal. O problema é nosso. E continuará a ser.
Até pode haver um antes e um depois dos "Documentos do Panamá", mas jamais haverá unanimidade entre países para acabar com os paraísos fiscais. Porque a lógica em que funcionam é a da selva: se há um predador que desiste, há logo outro que toma o seu lugar. Não existe espírito de manada. Além do mais, as offshore só respiram porque o oxigénio é fornecido por estados soberanos. Alguns do tamanho dos Estados Unidos da América, da Rússia e do Reino Unido.
Não, não vamos acabar com esta pornografia fiscal. Mas se expusermos os vícios e malfeitorias destas personagens, e as obrigarmos a pagar alguns milhões em falta, estaremos a dificultar-lhes um pouco mais a vida. É curto? É. Mas é o suficiente para ajudar os 99% que pagam impostos a conviver melhor com as suas obrigações.
EDITOR-EXECUTIVO-ADJUNTO
Pedro Ivo Carvalho
06 Abril 2016 às 00:05
Jornal de Notícias
Ainda assim, o problema é nosso. O problema é dos que vivem nos mais de 200 países ou territórios que os clientes da Mossack Fonseca usaram como morada para alimentar um esquema internacional de sem-vergonhice com sede no Panamá. Apenas um dos 60 refúgios fiscais que a globalização ajudou a florescer. A mesma globalização que, paradoxalmente, permite que o capital e os bens de 1% dos mais ricos (cuja fortuna supera a de todos os restantes) possam circular livremente sob o anonimato fiscal, mas que não aplica a mesma benesse aos restantes 99%.
Sim, o problema é nosso. Aquele dinheiro que não pagou impostos podia ser gasto nos nossos hospitais, nas nossas escolas e nos nossos tribunais. Aquele dinheiro que não pagou impostos é o mesmo que, sob a forma de branqueamento, ocultação de operações financeiras e demais expedientes, levou à ruína do BES, do BPP e do BPN. Pagos por quem nós sabemos. Aquele dinheiro esteve na génese da "Operação Furacão" e "Monte Branco". Foi, enfim, esse mesmo dinheiro que serviu para pagar "comissões" da venda dos submarinos a Portugal. O problema é nosso. E continuará a ser.
Até pode haver um antes e um depois dos "Documentos do Panamá", mas jamais haverá unanimidade entre países para acabar com os paraísos fiscais. Porque a lógica em que funcionam é a da selva: se há um predador que desiste, há logo outro que toma o seu lugar. Não existe espírito de manada. Além do mais, as offshore só respiram porque o oxigénio é fornecido por estados soberanos. Alguns do tamanho dos Estados Unidos da América, da Rússia e do Reino Unido.
Não, não vamos acabar com esta pornografia fiscal. Mas se expusermos os vícios e malfeitorias destas personagens, e as obrigarmos a pagar alguns milhões em falta, estaremos a dificultar-lhes um pouco mais a vida. É curto? É. Mas é o suficiente para ajudar os 99% que pagam impostos a conviver melhor com as suas obrigações.
EDITOR-EXECUTIVO-ADJUNTO
Pedro Ivo Carvalho
06 Abril 2016 às 00:05
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