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A revolta dos parasitas
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A revolta dos parasitas
A França está outra vez em alvoroço. Na pátria da guilhotina, da Revolução e do Maio de 68 milhares de pessoas têm ocupado diariamente a Praça da República de Paris e outros lugares emblemáticos de diversas cidades para mostrar a sua indignação pelo rumo dos acontecimentos. E qual é esse rumo? É o decorrente da vontade dos socialistas que, num exercício de responsabilidade, pretendem que a nação funcione, mude, se modernize. Mas tropeçaram no facto de muita gente querer que continue como está, porque apesar de tudo vive de uma maneira muito confortável: em França, metade do país é subsidiada pela outra, que arca com a totalidade da despesa. Esta, a que se levanta todas as manhãs para perseguir um sonho, é a que deveria estar a preparar as armas, mas é ao contrário: são os desocupados, os acomodados, os imprestáveis, os párias, os que não estão dispostos a perder os seus privilégios, os que todas as noites vão ocupar as praças da República no meio de um acolhimento caloroso por parte da imprensa progressista mundial, que não quer perder este magno acontecimento no qual encontrou um sentido renovado para a sua absurda existência.
Como a economia francesa gasta mais do que produz, tem um crescimento discreto e um desemprego galopante, o presidente Hollande decretou há uns meses uma espécie de plano de emergência que consistia em liberalizar alguns setores produtivos e alterar o modelo das relações laborais. Foi precisamente a reforma do mercado de trabalho o que desencadeou o movimento de protesto e a ira generalizada. O curioso é que se trata de uma reforma que é a cópia literal da que o governo de Rajoy pôs em marcha em Espanha há três anos, com tanto êxito que é o país que mais emprego cria na União Europeia e o que mais vai crescer entre os grandes do Continente, segundo assegurou o FMI na semana passada. Os indignados franceses, que no fundo são uns conservadores determinados a manter o statu quo a todo o custo, argumentam com um pretexto pueril para se revoltarem contra os socialistas: "Não se pode ganhar com votos de esquerda e governar para a direita." Mas quem governa para a direita? Quem aplicou as políticas liberais em França nos últimos anos? Vai contra as pessoas comuns permitir que o comércio possa abrir aos domingos e feriados com o objetivo de a França aproveitar a sua condição de primeira potência turística mundial e facilitar, de caminho, a vida aos seus cidadãos?
Hollande é apenas um socialista preocupado com a estagnação do país e parece disposto a fazer apenas umas mudanças menores. Jamais será um liberal, mas não é um idiota, está perfeitamente consciente, como tantos, de que chegou a hora de sacudir a nação, embora eu duvide de que tenha a vontade necessária para consumar a tarefa vendo as praças cheias de opositores e a imprensa progressista a zurzir constantemente aos seus ouvidos. A reforma laboral que foi proposta em França, a que teve lugar em Espanha há dois anos, é bastante simples. Consiste em reduzir os custos do despedimento com a certeza de que assim as empresas contratarão mais pessoas, e em flexibilizar as condições de trabalho promovendo uma negociação direta entre a empresa e os empregados que evite o prejuízo provocado pelos contratos coletivos e o poder omnímodo dos sindicatos. Todas estas mudanças seriam especialmente benéficas para as pessoas sem qualificações, para os jovens e, muito mais, para os que estão há muito tempo desempregados. Infelizmente, os eventuais beneficiários do projeto, impulsionados por intelectuais de fraca qualidade e bem pagos, e pelos meios de comunicação da "esquerda caviar", são os protagonistas destacados desta maré de cólera que não sabemos como acabará.
Os franceses têm motivos para estar indignados? Claro que sim, mas estes são exatamente os contrários daqueles que os manifestantes esgrimem. A indignação deveria ser por a produtividade do país estar a decrescer há anos, a capacidade para gerar riqueza ser cada vez menor, e uma das maiores nações da Europa se ter instalado na mediocridade. Uma mediocridade que, neste momento, apenas produz em abundância parasitas insatisfeitos. A produtividade não significa trabalhar mais, mas também não significa trabalhar menos. Convida a estar numa tensão permanente para gerar o maior valor acrescentado por pessoa. A competitividade é o outro pilar do progresso de qualquer país. Tem como objetivo vender mais do que os restantes e isso exige capacidade de produzir com a maior qualidade ao menor preço possível e, portanto, obriga a ter um custo do trabalho menor do que o dos países que se disputam no mercado e a criar um ecossistema geral que favoreça a inovação. Todas estas questões, que são as chaves para prosperar num mundo marcado pela globalização e por uma concorrência feroz, estão completamente ausentes nas grandes manifestações em França. Também o estiveram há uns anos em Madrid, a 15 de maio de 2011, data em que nasceu um movimento singular e precedente ao francês, quando uns jovens acomodados e egoístas, esses que não acabam a formação universitária a tempo e que continuam a viver à custa dos pais, exigiam mudanças profundas, aliados àqueles que começavam a sentir as consequências da crise e exigiam mais prosperidade e equidade. Foi este, na verdade, o caldo de cultura do partido radical e antissistema Podemos. Não sabemos ainda qual o monstro que o movimento de rua produzirá em França, onde, pelo contrário, há um populismo de direita vigoroso a que esta mobilização de esquerda tenta dar réplica. O que se pode dizer, num caso e noutro, é que as propostas excêntricas em cima da mesa não só estão fora da realidade como também são infantis. Acaba por ser devastador que, enquanto em Singapura, na China, na Nova Zelândia e noutros lugares as pessoas estejam totalmente empenhadas em ser competitivas, os nossos estúpidos jovens, os adultos encolerizados pela crise e os intelectuais que os defendem continuem a travar a batalha da redistribuição, dominados pela ansiedade de viver pior do que os seus pais em vez de estarem preocupados em ser cada dia mais produtivos.
Gaël Bustier, um perito francês em radicalismos políticos, uma qualificação que já diz muito, e tudo o que diz é mau, do grau de extravagância alcançado no país vizinho do meu, assegura que os amotinados nas praças francesas estão, no fundo, a travar um combate cultural. Certo, mas é um combate cultural de pacotilha. Em França, o peso do Estado é assustador, os impostos são elevados, a proteção social é gigantesca, os níveis de vida são superiores aos de qualquer outro país em redor. De que se queixam? Por outro lado, a vida das empresas é difícil, a produtividade está em declínio e a competitividade é cada vez menor. O combate cultural necessário é este: como vincular os franceses à construção de um país melhor com base no trabalho e no esforço em vez da vitimização e da queixa permanente. Como dotá-lo dos ares de liberalismo que estão em falta e que são o fantasma contra o qual lutam os parasitas insatisfeitos e indignados sem motivo.
22 DE ABRIL DE 2016
00:03
Miguel Angel Belloso
Diário de Notícias
Como a economia francesa gasta mais do que produz, tem um crescimento discreto e um desemprego galopante, o presidente Hollande decretou há uns meses uma espécie de plano de emergência que consistia em liberalizar alguns setores produtivos e alterar o modelo das relações laborais. Foi precisamente a reforma do mercado de trabalho o que desencadeou o movimento de protesto e a ira generalizada. O curioso é que se trata de uma reforma que é a cópia literal da que o governo de Rajoy pôs em marcha em Espanha há três anos, com tanto êxito que é o país que mais emprego cria na União Europeia e o que mais vai crescer entre os grandes do Continente, segundo assegurou o FMI na semana passada. Os indignados franceses, que no fundo são uns conservadores determinados a manter o statu quo a todo o custo, argumentam com um pretexto pueril para se revoltarem contra os socialistas: "Não se pode ganhar com votos de esquerda e governar para a direita." Mas quem governa para a direita? Quem aplicou as políticas liberais em França nos últimos anos? Vai contra as pessoas comuns permitir que o comércio possa abrir aos domingos e feriados com o objetivo de a França aproveitar a sua condição de primeira potência turística mundial e facilitar, de caminho, a vida aos seus cidadãos?
Hollande é apenas um socialista preocupado com a estagnação do país e parece disposto a fazer apenas umas mudanças menores. Jamais será um liberal, mas não é um idiota, está perfeitamente consciente, como tantos, de que chegou a hora de sacudir a nação, embora eu duvide de que tenha a vontade necessária para consumar a tarefa vendo as praças cheias de opositores e a imprensa progressista a zurzir constantemente aos seus ouvidos. A reforma laboral que foi proposta em França, a que teve lugar em Espanha há dois anos, é bastante simples. Consiste em reduzir os custos do despedimento com a certeza de que assim as empresas contratarão mais pessoas, e em flexibilizar as condições de trabalho promovendo uma negociação direta entre a empresa e os empregados que evite o prejuízo provocado pelos contratos coletivos e o poder omnímodo dos sindicatos. Todas estas mudanças seriam especialmente benéficas para as pessoas sem qualificações, para os jovens e, muito mais, para os que estão há muito tempo desempregados. Infelizmente, os eventuais beneficiários do projeto, impulsionados por intelectuais de fraca qualidade e bem pagos, e pelos meios de comunicação da "esquerda caviar", são os protagonistas destacados desta maré de cólera que não sabemos como acabará.
Os franceses têm motivos para estar indignados? Claro que sim, mas estes são exatamente os contrários daqueles que os manifestantes esgrimem. A indignação deveria ser por a produtividade do país estar a decrescer há anos, a capacidade para gerar riqueza ser cada vez menor, e uma das maiores nações da Europa se ter instalado na mediocridade. Uma mediocridade que, neste momento, apenas produz em abundância parasitas insatisfeitos. A produtividade não significa trabalhar mais, mas também não significa trabalhar menos. Convida a estar numa tensão permanente para gerar o maior valor acrescentado por pessoa. A competitividade é o outro pilar do progresso de qualquer país. Tem como objetivo vender mais do que os restantes e isso exige capacidade de produzir com a maior qualidade ao menor preço possível e, portanto, obriga a ter um custo do trabalho menor do que o dos países que se disputam no mercado e a criar um ecossistema geral que favoreça a inovação. Todas estas questões, que são as chaves para prosperar num mundo marcado pela globalização e por uma concorrência feroz, estão completamente ausentes nas grandes manifestações em França. Também o estiveram há uns anos em Madrid, a 15 de maio de 2011, data em que nasceu um movimento singular e precedente ao francês, quando uns jovens acomodados e egoístas, esses que não acabam a formação universitária a tempo e que continuam a viver à custa dos pais, exigiam mudanças profundas, aliados àqueles que começavam a sentir as consequências da crise e exigiam mais prosperidade e equidade. Foi este, na verdade, o caldo de cultura do partido radical e antissistema Podemos. Não sabemos ainda qual o monstro que o movimento de rua produzirá em França, onde, pelo contrário, há um populismo de direita vigoroso a que esta mobilização de esquerda tenta dar réplica. O que se pode dizer, num caso e noutro, é que as propostas excêntricas em cima da mesa não só estão fora da realidade como também são infantis. Acaba por ser devastador que, enquanto em Singapura, na China, na Nova Zelândia e noutros lugares as pessoas estejam totalmente empenhadas em ser competitivas, os nossos estúpidos jovens, os adultos encolerizados pela crise e os intelectuais que os defendem continuem a travar a batalha da redistribuição, dominados pela ansiedade de viver pior do que os seus pais em vez de estarem preocupados em ser cada dia mais produtivos.
Gaël Bustier, um perito francês em radicalismos políticos, uma qualificação que já diz muito, e tudo o que diz é mau, do grau de extravagância alcançado no país vizinho do meu, assegura que os amotinados nas praças francesas estão, no fundo, a travar um combate cultural. Certo, mas é um combate cultural de pacotilha. Em França, o peso do Estado é assustador, os impostos são elevados, a proteção social é gigantesca, os níveis de vida são superiores aos de qualquer outro país em redor. De que se queixam? Por outro lado, a vida das empresas é difícil, a produtividade está em declínio e a competitividade é cada vez menor. O combate cultural necessário é este: como vincular os franceses à construção de um país melhor com base no trabalho e no esforço em vez da vitimização e da queixa permanente. Como dotá-lo dos ares de liberalismo que estão em falta e que são o fantasma contra o qual lutam os parasitas insatisfeitos e indignados sem motivo.
22 DE ABRIL DE 2016
00:03
Miguel Angel Belloso
Diário de Notícias
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