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Regras para sobreviver na nova União Europeia
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Regras para sobreviver na nova União Europeia
Portugal precisa de reaprender a navegar nas águas turbulentas do mundo, e, em especial, no mar encapelado de uma UE tortuosamente distorcida pela longa e continuada crise onde continuamos mergulhados.
A primeira regra a aprender confirma que a integração europeia de Estados e povos, baseada na lei e na justiça, foi usurpada por uma nova "balança do poder", fundada na hegemonia e no intergovernamentalismo. Quando a chanceler Merkel chamou o FMI, como condição para viabilizar o "resgate" da Grécia em 2010, limitou-se a clarificar a mudança de alma que se estava a produzir no processo de integração europeia desde a marcha para o euro, cujo início foi formalizado em Maastricht, em 1992. A UEM (União Económica e Monetária) nunca passou de um esboço grosseiro. Sem o suporte e a legitimidade de uma união política, fiscal e orçamental, sem coordenação económica, o euro criou um terreno para a perpetuação das desigualdades entre países, apesar da retórica da convergência e da coesão económica social (de que hoje nem sequer se fala...). Aqueles países que esperavam pelo prevalecer da solidariedade em tempos de crise perceberam, quando viram as taxas de juro a subir vertiginosamente, que o euro consagrava não uma Europa de leis universais, mas uma nova "balança de poder" entre credores e devedores, entre exportadores e importadores. A UE é hoje dirigida pelo Conselho Europeu, onde vassalos e suseranos se vigiam mutuamente. Não admira que a Alemanha, o primeiro país a interpretar a moeda comum como um campo de batalha pela supremacia económica, tenha, provisoriamente, ocupado um frágil trono.
A segunda regra assinala a assimetria entre a escala dos problemas e a exiguidade das soluções. A incapacidade de reformar estruturalmente as instituições da UE tem conduzido a uma Europa aprisionada numa lógica de bricolage, multiplicando panaceias que prolongam a agonia no tempo, deixando novas fontes de tensão e perigo juntarem-se às iniciais, meramente remendadas. Em vez de refundar federalmente a UE, criaram-se novos tratados intergovernamentais (Tratado Orçamental, Mecanismo Europeu de Estabilidade, Fundo Comum de Resolução Bancária...), que aumentam a confusão normativa e a margem de arbitrariedade nas decisões. Por outro lado, novas agências são constituídas para acudir à erosão do espaço Schengen (Frontex), e uma diplomacia eivada de desesperado pragmatismo é desenvolvida para acudir às vagas de refugiados, que a ausência de uma política externa e de segurança comum ajudou a fomentar.
A terceira regra adverte para a natureza crescentemente difusa e fragmentária do poder na UE. A União é hoje uma criatura de muitas cabeças, como o monstro Behemoth, de que falava Hobbes a propósito da guerra civil inglesa no século XVII. Na questão dos refugiados, por exemplo, a Hungria e a Polónia batem o pé a Berlim, recusando o sistema de quotas, que Lisboa, corretamente, aceita. E a Turquia ganhou um protagonismo maior do que o da maioria dos Estados membros. Mesmo na área económica, a hegemonia alemã é moderada pelo poder funcional do BCE, que tem contrariado, através de uma política monetária expansionista, a pulsão de Berlim para transformar o seu peculiar ordoliberalismo em lei universal. Sintomaticamente, uma instituição não eleita, como o BCE, tem sido capaz de ver o conjunto europeu com mais inteligência do que os governantes eleitos, fechados numa desfocada ótica nacional, sempre de curtíssimo prazo, e tecnicamente incompetente.
A quarta regra fundamental consiste no princípio da Destruição Mútua Assegurada. Se mesmo para os países que estão fora da zona euro, como o Reino Unido, a saída da UE seria uma tragédia, para os países da zona euro pensar que é possível uma "saída ordenada" do euro - como se reclama nalguma esquerda em Portugal, ou na extrema-direita em França - é o mesmo que propor saltar de um avião, sem paraquedas, para escapar a um pirata do ar. Portugal deve procurar estabelecer alianças com outros Estados membros, em torno de roteiros estratégicos que procurem respostas integradas para os diferentes problemas comuns (dívida pública e privada excessivas, debilidade do sistema financeiro, estagnação económica, desemprego, refugiados, etc.). Portugal precisa de falar com todos (com especial ênfase para Berlim), e com todos fazer a pedagogia da autopreservação: estamos de tal modo interdependentes na UE e na zona euro, que se não formos capazes de criar um espaço habitável comum, baseado na lei e na justiça, acabaremos por implodir em conjunto, numa desordem económica e política, com epicentro na Europa, mas de impacto mundial.
Há 30 anos, a III Guerra Mundial foi evitada porque norte-americanos e soviéticos perceberam que numa guerra atómica não haveria vencedores, só derrotados. Os europeus, hoje, apenas têm de perceber que se a sua casa comum desabar todos seremos esmagados debaixo dos seus escombros. Se tardamos a concordar no desenho do futuro, talvez um medo esclarecido possa alertar-nos para o abismo que nos engolirá se não mudarmos de rumo.
29 DE MAIO DE 2016
00:04
Viriato Soromenho Marques
Diário de Notícias
A primeira regra a aprender confirma que a integração europeia de Estados e povos, baseada na lei e na justiça, foi usurpada por uma nova "balança do poder", fundada na hegemonia e no intergovernamentalismo. Quando a chanceler Merkel chamou o FMI, como condição para viabilizar o "resgate" da Grécia em 2010, limitou-se a clarificar a mudança de alma que se estava a produzir no processo de integração europeia desde a marcha para o euro, cujo início foi formalizado em Maastricht, em 1992. A UEM (União Económica e Monetária) nunca passou de um esboço grosseiro. Sem o suporte e a legitimidade de uma união política, fiscal e orçamental, sem coordenação económica, o euro criou um terreno para a perpetuação das desigualdades entre países, apesar da retórica da convergência e da coesão económica social (de que hoje nem sequer se fala...). Aqueles países que esperavam pelo prevalecer da solidariedade em tempos de crise perceberam, quando viram as taxas de juro a subir vertiginosamente, que o euro consagrava não uma Europa de leis universais, mas uma nova "balança de poder" entre credores e devedores, entre exportadores e importadores. A UE é hoje dirigida pelo Conselho Europeu, onde vassalos e suseranos se vigiam mutuamente. Não admira que a Alemanha, o primeiro país a interpretar a moeda comum como um campo de batalha pela supremacia económica, tenha, provisoriamente, ocupado um frágil trono.
A segunda regra assinala a assimetria entre a escala dos problemas e a exiguidade das soluções. A incapacidade de reformar estruturalmente as instituições da UE tem conduzido a uma Europa aprisionada numa lógica de bricolage, multiplicando panaceias que prolongam a agonia no tempo, deixando novas fontes de tensão e perigo juntarem-se às iniciais, meramente remendadas. Em vez de refundar federalmente a UE, criaram-se novos tratados intergovernamentais (Tratado Orçamental, Mecanismo Europeu de Estabilidade, Fundo Comum de Resolução Bancária...), que aumentam a confusão normativa e a margem de arbitrariedade nas decisões. Por outro lado, novas agências são constituídas para acudir à erosão do espaço Schengen (Frontex), e uma diplomacia eivada de desesperado pragmatismo é desenvolvida para acudir às vagas de refugiados, que a ausência de uma política externa e de segurança comum ajudou a fomentar.
A terceira regra adverte para a natureza crescentemente difusa e fragmentária do poder na UE. A União é hoje uma criatura de muitas cabeças, como o monstro Behemoth, de que falava Hobbes a propósito da guerra civil inglesa no século XVII. Na questão dos refugiados, por exemplo, a Hungria e a Polónia batem o pé a Berlim, recusando o sistema de quotas, que Lisboa, corretamente, aceita. E a Turquia ganhou um protagonismo maior do que o da maioria dos Estados membros. Mesmo na área económica, a hegemonia alemã é moderada pelo poder funcional do BCE, que tem contrariado, através de uma política monetária expansionista, a pulsão de Berlim para transformar o seu peculiar ordoliberalismo em lei universal. Sintomaticamente, uma instituição não eleita, como o BCE, tem sido capaz de ver o conjunto europeu com mais inteligência do que os governantes eleitos, fechados numa desfocada ótica nacional, sempre de curtíssimo prazo, e tecnicamente incompetente.
A quarta regra fundamental consiste no princípio da Destruição Mútua Assegurada. Se mesmo para os países que estão fora da zona euro, como o Reino Unido, a saída da UE seria uma tragédia, para os países da zona euro pensar que é possível uma "saída ordenada" do euro - como se reclama nalguma esquerda em Portugal, ou na extrema-direita em França - é o mesmo que propor saltar de um avião, sem paraquedas, para escapar a um pirata do ar. Portugal deve procurar estabelecer alianças com outros Estados membros, em torno de roteiros estratégicos que procurem respostas integradas para os diferentes problemas comuns (dívida pública e privada excessivas, debilidade do sistema financeiro, estagnação económica, desemprego, refugiados, etc.). Portugal precisa de falar com todos (com especial ênfase para Berlim), e com todos fazer a pedagogia da autopreservação: estamos de tal modo interdependentes na UE e na zona euro, que se não formos capazes de criar um espaço habitável comum, baseado na lei e na justiça, acabaremos por implodir em conjunto, numa desordem económica e política, com epicentro na Europa, mas de impacto mundial.
Há 30 anos, a III Guerra Mundial foi evitada porque norte-americanos e soviéticos perceberam que numa guerra atómica não haveria vencedores, só derrotados. Os europeus, hoje, apenas têm de perceber que se a sua casa comum desabar todos seremos esmagados debaixo dos seus escombros. Se tardamos a concordar no desenho do futuro, talvez um medo esclarecido possa alertar-nos para o abismo que nos engolirá se não mudarmos de rumo.
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00:04
Viriato Soromenho Marques
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