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Mensagem por Admin Sáb Jun 18, 2016 11:04 am

Os portugueses vivem acima das suas possibilidades ou têm políticos abaixo das nossas necessidades?

Cliente ao balcão: “Segundo o Observatório Português dos Sistemas de Saúde os pobres são os mais doentes.”

Barman: “Que insensatez. Adoecem acima das suas possibilidades.”

Este foi o Bartoon de quarta-feira, em que Luís Afonso lançava o seu olhar sobre o resultado do relatório de Primavera do Observatório Português dos Sistemas de Saúde (OPSS) apresentado na terça-feira em Lisboa e divulgado nessa manhã pelo PÚBLICO. Neste documento, o OPSS analisava a evolução de indicadores sobre a saúde em Portugal entre 2005 e 2014, a década em que o país viveu em crise financeira e económica e em que ficou sujeito à intervenção e monitorização do ajustamento orçamental do Estado pela Comissão Europeia, o Banco Central Europeu e o Fundo Monetário Internacional, em troca de um empréstimo de 78 mil milhões de euros que viabilizou a sobrevivência do Estado.

Ora, esse ajustamento, nos moldes em que foi negociado e concretizado, consistiu precisamente numa abrupta redução da despesa pública e paralelo crescimento da receita através do aumento da carga fiscal sobre o trabalho por conta de outrem, do qual resultou um empobrecimento real da população portuguesa. É esse empobrecimento que se reflecte na análise dos dados sobre saúde feitos pelo OPSS. A conclusão é lapidar: “Seja qual for a doença, a desigualdade aumentou claramente entre 2005 e 2014, independentemente do sexo e da idade”.

Refira-se que a jornalista Alexandra Campos acrescentava na notícia que “o fenómeno das desigualdades é determinante, até porque tem um impacto significativo na esperança de vida, como provou um recente estudo publicado no Journal of American Medical Association”, um estudo que avança que, entre 2001 e 2014, “os homens mais ricos dos Estados Unidos da América viveram em média mais 14,6 anos do que os homens mais pobres”. Esclarecendo que, em relação a Portugal, não esta avaliação não está feita.

Os indicadores internacionais sobre o desenvolvimento humano – quer seja a saúde, a educação, a esperança de vida, a natalidade - são variáveis em ambos os sentidos. E é cristalino que a vida em sociedade e a história não são um caminho de um só sentido, o do progresso. A história dos países e das civilizações está repleta de retrocessos. E é um retrocesso no seu desenvolvimento e no nível de bem-estar da população portuguesa o que resulta de processos de ajustamento orçamental do Estado como o que foi feito e ainda está parcialmente em vigor em Portugal.

É certo que os governos não podem recorrer a mecanismos inflacionários nem montar fábricas de multiplicar notas com os condicionalismos do euro, mas mesmo que o fizessem em nada isso iria contrariar o empobrecimento real da sociedade portuguesa. E este é visível também em vários indicadores económicos ao longo da década e que resultaram do ajustamento.

Ainda que o salário mínimo tenha subido entre 2005 e 2014 de 374,7 euros para 485 euros e que o salário base médio tenha aumentado de 764,7 euros para 914, 1 euros, o que é facto é que o empobrecimento é real por força de fenómenos como o impacto dos aumento de impostos directos e indirectos associado a factores como o desemprego que nesta mesma década aumentou de 7,6% para 13,9%, tendo tido um pico de 17,5% no primeiro trimestre de 2013.

Um esforço imenso e que resultou numa baixa do défice, durante a mesma década, de 6% para 3,7%, esta última, claro, sem operações especiais como bancos falidos, já que com eles ascende a 4,5%. Mas que em termos de dívida pública não serviu de grande coisa, aliás, ela até aumentou, já que em 2005 era de 65% do PIB e em 2014 128,7 % do PIB. Ou seja, de 106,9 mil milhões em 2005 para 225,8 mil milhões em 2014 e já agora para 231,3 mil milhões de euros em 2015.

Ora, o que é facto é que quase nenhuns objectivos do ajustamento foram atingidos e ainda que o défice tenha baixado, a dívida aumentou muito para além do que é a soma do empréstimo de 78 mil milhões recebidos em 2011. Mais o crescimento económico e o emprego insistem em não disparar. Mas há um efeito que parece ter resultado desse ajustamento, que mais não foi do que o empobrecimento do país: a degradação da qualidade de vida e a acção desta sobre a saúde dos portugueses. Resta esperar pela evolução de outros indicadores nesta década, para se ter o retrato completo.

Um dos temas de propaganda que enquadrou o ajustamento foi a ideia de que os portugueses vivam acima das suas possibilidades. Daí a ironia de Luís Afonso no Bartoon que citamos. Mas há uma outra conclusão que pode ser tirada a partir da análise da evolução do país, é a de que temos políticos abaixo das nossas necessidades.

Por São José Almeida
18/06/2016 - 00:15
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