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Por uma vez, boas notícias no Atlântico
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Por uma vez, boas notícias no Atlântico
Salvo imprevisível surpresa de última hora, a cimeira entre a União Europeia e o Canadá prevista para 5ªf para assinar o (o tratado de livre comércio entre a União Europeia e o Canadá) não se realizará. A partir daí, ou se abrem novas rondas de negociações sobre as 2344 páginas do tratado ou este morre já. Depois da provável boa notícia da anulação da cimeira, o fim do tratado seria uma óptima consequência.
A razão foi noticiada no PÚBLICO:
Paul Magnette, o ministro-presidente de uma das regiões da Bélgica, a Valónia, liderou uma frente contra o tratado, incluindo a maioria do parlamento regional. Ele, socialista, é, ao que se sabe, um defensor da globalização e mesmo das regras financeiras que trouxeram a Europa até ao actual estado comatoso da política e da economia, mas achou que assinar este tratado era ir longe demais. Ora, como a Bélgica passou a conceder às suas regiões o direito constitucional de bloquearem decisões nacionais deste tipo, a União Europeia não tem unanimidade e não pode portanto assinar o tratado.
Há três razões principais para recusar o tratado, na opinião de Magnette e de outros críticos. A primeira é que este tratado prevê uma regra de protecção do investimento externo que abre a porta a uma ofensiva de multinacionais contra o direito de cada país. Esta regra é a das “expectativas legítimas”, permitindo que uma empresa demande em tribunal um governo por uma lei ou deliberação que prejudique a sua rentabilidade. Curiosamente, o Canadá tem essa experiência amarga, porque empresas norte-americanas processaram o Estado canadiano por ter proibido alguns químicos cancerígenos nos combustíveis. As empresas acusadoras sentiram que os seus lucros poderiam diminuir por esse abuso. O mesmo dirá o Uruguai, que foi processado pela Philip Morris porque a lei determinou que os maços de tabaco teriam informação sobre os seus perigos para a saúde – e, isso , como é bom de ver, pode diminuir o lucro da empresa.
Por tudo isto, a criação de um mecanismo de arbitragem com poder decisório é crucial. Este mecanismo, no CETA, é um parente distante e até mais moderado do que foi inventado pela Alemanha em 1959 e prevê o procedimento de um tribunal arbitral para resolver, de forma expedita, algum choque que possa ocorrer entre empresas investidoras estrangeiras e governos nacionais. Mas não é um assunto fechado, porque agora o próprio Tribunal Constitucional alemão condiciona a assinatura do seu governo à eliminação deste mecanismo de arbitragem – a experiência conta.
A terceira razão é a norma do CETA que determina que os governos abdicam do direito de nacionalizar um serviço que tenha sido privatizado, como por exemplo os Correios. Em nome da proteção da livre circulação de capitais, alguns serviços públicos passam a ser extraterritoriais.
Sete anos de negociações e chegamos aqui. Estava tudo pronto, todos os governos disponíveis, a maioria do Parlamento Europeu apressada ao ponto de se definir que o tratado entrava provisoriamente em vigor mesmo antes de ser ratificado pelos parlamentos nacionais, estava tudo garantido. Só não se previa que um socialista tivesse vergonha desta deriva. Se os leitores se perguntarem como é que outros socialistas aprovavam esta aventura, só lhes posso lembrar tudo o que a União Europeia tem sido até hoje e que havia 28 governos disponíveis para esta consagração neoliberal. Não quiseram aprender nada desde de 2008. Cantando e rindo, a Europa vai sendo um pátio da finança, salvo estes incidentes que lembram que ainda há quem resista.
Por Francisco Louçã
26/10/2016 - 06:15
Público
A razão foi noticiada no PÚBLICO:
Paul Magnette, o ministro-presidente de uma das regiões da Bélgica, a Valónia, liderou uma frente contra o tratado, incluindo a maioria do parlamento regional. Ele, socialista, é, ao que se sabe, um defensor da globalização e mesmo das regras financeiras que trouxeram a Europa até ao actual estado comatoso da política e da economia, mas achou que assinar este tratado era ir longe demais. Ora, como a Bélgica passou a conceder às suas regiões o direito constitucional de bloquearem decisões nacionais deste tipo, a União Europeia não tem unanimidade e não pode portanto assinar o tratado.
Há três razões principais para recusar o tratado, na opinião de Magnette e de outros críticos. A primeira é que este tratado prevê uma regra de protecção do investimento externo que abre a porta a uma ofensiva de multinacionais contra o direito de cada país. Esta regra é a das “expectativas legítimas”, permitindo que uma empresa demande em tribunal um governo por uma lei ou deliberação que prejudique a sua rentabilidade. Curiosamente, o Canadá tem essa experiência amarga, porque empresas norte-americanas processaram o Estado canadiano por ter proibido alguns químicos cancerígenos nos combustíveis. As empresas acusadoras sentiram que os seus lucros poderiam diminuir por esse abuso. O mesmo dirá o Uruguai, que foi processado pela Philip Morris porque a lei determinou que os maços de tabaco teriam informação sobre os seus perigos para a saúde – e, isso , como é bom de ver, pode diminuir o lucro da empresa.
Por tudo isto, a criação de um mecanismo de arbitragem com poder decisório é crucial. Este mecanismo, no CETA, é um parente distante e até mais moderado do que foi inventado pela Alemanha em 1959 e prevê o procedimento de um tribunal arbitral para resolver, de forma expedita, algum choque que possa ocorrer entre empresas investidoras estrangeiras e governos nacionais. Mas não é um assunto fechado, porque agora o próprio Tribunal Constitucional alemão condiciona a assinatura do seu governo à eliminação deste mecanismo de arbitragem – a experiência conta.
A terceira razão é a norma do CETA que determina que os governos abdicam do direito de nacionalizar um serviço que tenha sido privatizado, como por exemplo os Correios. Em nome da proteção da livre circulação de capitais, alguns serviços públicos passam a ser extraterritoriais.
Sete anos de negociações e chegamos aqui. Estava tudo pronto, todos os governos disponíveis, a maioria do Parlamento Europeu apressada ao ponto de se definir que o tratado entrava provisoriamente em vigor mesmo antes de ser ratificado pelos parlamentos nacionais, estava tudo garantido. Só não se previa que um socialista tivesse vergonha desta deriva. Se os leitores se perguntarem como é que outros socialistas aprovavam esta aventura, só lhes posso lembrar tudo o que a União Europeia tem sido até hoje e que havia 28 governos disponíveis para esta consagração neoliberal. Não quiseram aprender nada desde de 2008. Cantando e rindo, a Europa vai sendo um pátio da finança, salvo estes incidentes que lembram que ainda há quem resista.
Por Francisco Louçã
26/10/2016 - 06:15
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