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A maldita virose telefónica
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A maldita virose telefónica
Num mercado competitivo e maduro como o português a guerra nas telecomunicações acontece cliente a cliente, cabelo a cabelo, num desrespeito total pela proteção da identidade e tranquilidade das vítimas
Há dias mudei de contrato de abastecimento de água, gás e eletricidade. O único que não alterei foi o de serviço de televisão e internet. Não fiz pedido nenhum, não pesquisei propostas alternativas na web, não comparei os preços dos diferentes operadores, não comentei com ninguém do meio ou fora dele que pretendia ter um preço mais barato, uma rede mais veloz, mais oferta de filmes, logicamente filmes bons, ou então um novo telemóvel, o que fosse; não mexi um dedo, não fiz um único suspiro sobre o assunto.
E no entanto, de repente, fui atacado por dezenas de telefonemas das diferentes empresas que existem - todas elas. Recebi chamadas de hora a hora, sem parar, sofregamente, logo a partir das nove da manhã até ao fim da tarde, às vezes já mesmo para o tarde, depois da hora de jantar, sempre com a mesma conversa intrusiva, agressiva, chata, repetitiva até ao aborrecimento mortal ou então levando-me à fúria mais descontrolada e até indelicada. Parecia que estava no souk de Marraquexe sob a pressão de um vendedor desesperado pela estação baixa.
Perguntei a todos os que me ligaram o motivo para este intempestivo surto comercial. Quis saber a razão para que de repente tivessem todos chegado ao mesmo tempo à extraordinária conclusão de que, estando eu a mudar os contratos de água, luz e eletricidade, logicamente também desejaria com ardor febril mudar imediatamente (digo: já) de operador de televisão.
Não obtive esclarecimento nenhum, nem mesmo a mais leve compreensão pelo que me estava a acontecer, apesar das minhas súplicas. Nem sequer consegui que o assédio, o bullying, a maldita tortura comercial terminassem ou pelo menos abrandassem um pouco para me deixar atender outros telefonemas ou então fazer outras coisas mais proveitosas. Bloqueei alguns números, bloqueei vários números como nunca tinha feito na vida, mas, como água que se infiltra por um telhado estragado, havia sempre alguém de novo a impor-se e a importunar-me com preçários e questionários de A a Z.
Hoje sei que há uma rede de intermediários que faz pela vida sem grande pudor e com extrema agressividade. Talvez esta rede que enxameia as grandes operadoras de telecomunicações, permitindo-lhes somar anos após ano resultados bojudos, tenha conseguido montar uma rede de informação - uma espécie de toupeiras bem colocadas - que lhes permite saber que uma pessoa que muda de fornecedor de luz, gás ou água provavelmente também ambiciona comprometer-se com um novo operador de televisão por um ou dois anos. Num mercado competitivo e maduro como o português a guerra nas telecomunicações acontece cliente a cliente, cabelo a cabelo, num desrespeito total pela proteção da identidade e tranquilidade das vítimas.
Há um regulador que talvez (talvez...) esteja atento a estas viroses comerciais, mas não deixa de me espantar não apenas a impunidade como também o facto de este como outros assuntos ligados ao consumo, isto é, à vida e ao dia-a-dia das pessoas, não fazer parte das preocupações políticas de quem manda ou dos que deveriam fiscalizar os que decidem. Não faz parte sequer das nossas inquietações jornalísticas. Vivemos todos absolutamente vidrados na dívida pública, nas grandes questões orçamentais, no FMI, na OCDE, em Bruxelas e em Frankfurt. O resto não existe e não interessa. O melhor, portanto, é não atender o telefone ou então fazer como faz um amigo a quem contei esta história. Quando estas empresas lhe ligam, ele coloca a voz no tom adequado e diz: essa pessoa morreu, foi uma morte muito horrível.
O óbito comercial é a melhor forma de sobrevivência.
PS - As pessoas não contam para o concreto, mas depois é-lhes pedido que decidam se o país deve sair da União Europeia, se deve aceitar imigrantes, se deve ou não ter duas câmaras, uma alta e uma baixa, talvez um dia os portugueses tenham de decidir se o país deve sair ou permanecer na moeda única. Os referendos para estas questões políticas de grande dimensão e impacto são a maior tragédia dos tempos que vivemos. São uma farsa. São um risco para a democracia. Os povos, nestes casos, não votam para defender os seus interesses. Votam apenas para castigar e punir - mesmo que no fim sejam elas as principais vítimas da decisão inopinada que tomaram. A Itália é apenas o último exemplo.
10 DE DEZEMBRO DE 2016
00:00
André Macedo
Diário de Notícias
Há dias mudei de contrato de abastecimento de água, gás e eletricidade. O único que não alterei foi o de serviço de televisão e internet. Não fiz pedido nenhum, não pesquisei propostas alternativas na web, não comparei os preços dos diferentes operadores, não comentei com ninguém do meio ou fora dele que pretendia ter um preço mais barato, uma rede mais veloz, mais oferta de filmes, logicamente filmes bons, ou então um novo telemóvel, o que fosse; não mexi um dedo, não fiz um único suspiro sobre o assunto.
E no entanto, de repente, fui atacado por dezenas de telefonemas das diferentes empresas que existem - todas elas. Recebi chamadas de hora a hora, sem parar, sofregamente, logo a partir das nove da manhã até ao fim da tarde, às vezes já mesmo para o tarde, depois da hora de jantar, sempre com a mesma conversa intrusiva, agressiva, chata, repetitiva até ao aborrecimento mortal ou então levando-me à fúria mais descontrolada e até indelicada. Parecia que estava no souk de Marraquexe sob a pressão de um vendedor desesperado pela estação baixa.
Perguntei a todos os que me ligaram o motivo para este intempestivo surto comercial. Quis saber a razão para que de repente tivessem todos chegado ao mesmo tempo à extraordinária conclusão de que, estando eu a mudar os contratos de água, luz e eletricidade, logicamente também desejaria com ardor febril mudar imediatamente (digo: já) de operador de televisão.
Não obtive esclarecimento nenhum, nem mesmo a mais leve compreensão pelo que me estava a acontecer, apesar das minhas súplicas. Nem sequer consegui que o assédio, o bullying, a maldita tortura comercial terminassem ou pelo menos abrandassem um pouco para me deixar atender outros telefonemas ou então fazer outras coisas mais proveitosas. Bloqueei alguns números, bloqueei vários números como nunca tinha feito na vida, mas, como água que se infiltra por um telhado estragado, havia sempre alguém de novo a impor-se e a importunar-me com preçários e questionários de A a Z.
Hoje sei que há uma rede de intermediários que faz pela vida sem grande pudor e com extrema agressividade. Talvez esta rede que enxameia as grandes operadoras de telecomunicações, permitindo-lhes somar anos após ano resultados bojudos, tenha conseguido montar uma rede de informação - uma espécie de toupeiras bem colocadas - que lhes permite saber que uma pessoa que muda de fornecedor de luz, gás ou água provavelmente também ambiciona comprometer-se com um novo operador de televisão por um ou dois anos. Num mercado competitivo e maduro como o português a guerra nas telecomunicações acontece cliente a cliente, cabelo a cabelo, num desrespeito total pela proteção da identidade e tranquilidade das vítimas.
Há um regulador que talvez (talvez...) esteja atento a estas viroses comerciais, mas não deixa de me espantar não apenas a impunidade como também o facto de este como outros assuntos ligados ao consumo, isto é, à vida e ao dia-a-dia das pessoas, não fazer parte das preocupações políticas de quem manda ou dos que deveriam fiscalizar os que decidem. Não faz parte sequer das nossas inquietações jornalísticas. Vivemos todos absolutamente vidrados na dívida pública, nas grandes questões orçamentais, no FMI, na OCDE, em Bruxelas e em Frankfurt. O resto não existe e não interessa. O melhor, portanto, é não atender o telefone ou então fazer como faz um amigo a quem contei esta história. Quando estas empresas lhe ligam, ele coloca a voz no tom adequado e diz: essa pessoa morreu, foi uma morte muito horrível.
O óbito comercial é a melhor forma de sobrevivência.
PS - As pessoas não contam para o concreto, mas depois é-lhes pedido que decidam se o país deve sair da União Europeia, se deve aceitar imigrantes, se deve ou não ter duas câmaras, uma alta e uma baixa, talvez um dia os portugueses tenham de decidir se o país deve sair ou permanecer na moeda única. Os referendos para estas questões políticas de grande dimensão e impacto são a maior tragédia dos tempos que vivemos. São uma farsa. São um risco para a democracia. Os povos, nestes casos, não votam para defender os seus interesses. Votam apenas para castigar e punir - mesmo que no fim sejam elas as principais vítimas da decisão inopinada que tomaram. A Itália é apenas o último exemplo.
10 DE DEZEMBRO DE 2016
00:00
André Macedo
Diário de Notícias
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