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Pensar o emprego científico
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Pensar o emprego científico
A Comissão Parlamentar de Educação e Ciência tem em mãos a melhoria do diploma do Emprego Científico (DL 57/2016). Foi importante que o Parlamento tenha chamado a si este diploma. Manuel Heitor cometeu erros crassos, que o fragilizaram (e muito). Foi salvo pelos partidos que apoiaram a formação do governo, estando por verificar se compreendeu esse auxílio.
No teor das propostas conhecidas há um marco que se conseguiu instaurar (graças também à ação do GP-PS), reorientando para a inserção na carreira. É um ponto de consenso à esquerda, que permite a consolidação de um sistema em envelhecimento. Algumas dúvidas do CDS-PP devem ser vencidas, a bem da defesa do interesse nacional. Sem um sistema científico estável e com condições, Portugal torna-se um país frágil. Olhar para os EUA é verificar a força das suas agências de Estado, fundamento do seu desenvolvimento. As questões de sustentabilidade implicam reforçar o consenso sobre a ciência, uma qualidade herdada de Adriano Moreira.
O PSD pode fazer a diferença fundamental, permitindo retirar algo de positivo de uma pasta que não lhe correu bem quando esteve no governo. A visão de valorização, com vencimentos competitivos a nível internacional (que existia no programa Investigador FCT), permite uma política de captação de talentos, impedindo a política de desvalorização e baixos salários de Manuel Heitor (pior, só os docentes de baixo custo propostos por um certo reitor).
O consenso alargado sobre o valor da ciência é por vezes quebrado por um lugar-comum que vem de tempos idos. Insiste-se num Portugal pobre, de nichos exclusivos. Um erro tão mais grave quanto o quadro de qualificação alargada que tem vindo a sair por culpa de tal ideia.
Pensar é vencer lugares-comuns. Como o de que o emprego científico deve ser precário para aumentar a produtividade. É falso. Veja-se o que diz a European Science Foundation. A precariedade é propensa a métricas. Reflete a procura pelo que permite alcançar o lugar estável. Tais métricas podem esconder uma produção estéril. Contudo, a ESF demonstra que os investigadores de carreira não só mantêm as dinâmicas de publicação como produzem com maior impacto social e económico, incluindo maior entrosamento na comunidade e influência nas decisões públicas. Em ciência a estabilidade é fundamental, permitindo uma maior e melhor produtividade.
Sabemos o que se fez de errado. Subverteram-se as bolsas (um apoio à formação) utilizando-as como instrumento de contratação. Um conjunto de interesses e de circunstâncias ditou que a contratação por fundos europeus se concentrasse na figura do bolseiro. Desvalorizou-se, precarizou-se e descapitalizou-se a Segurança Social, de tal forma que em breve teremos mesmo investigadores de nível mundial com reformas de valor mínimo.
Os estudos da OCDE apresentam Portugal como o pior nos níveis de precariedade dos mais qualificados, seja na economia em geral seja no espaço do ensino superior e ciência. Uma desvalorização da qualificação, que nos condena.
O estudo da ESF demonstra o problema maior: as economias do Sul da Europa possuem um crescimento em muito alimentado pelo crescimento do turismo (restauração, alojamento), o que contrasta com o dos países do Norte. O resultado é a emigração qualificada do Sul para o Norte, descapitalizando de investimento e acentuando o carácter periférico.
Há uma diferença entre economias que criam o smartphone e as que apenas desenvolvem aplicações para o smartphone. A capacidade do sistema tecnológico, científico e de ensino superior é a chave para as primeiras. Um ensino superior e ciência fortes são matéria que exige condições e recursos, possuindo outros agentes a nível global capacidade política e financeira para os fazer afirmar. É geopolítica.
Não podemos condenar o Sul da Europa à mera reprodução e aplicação do que é desenvolvido no Norte, ou à circulação em passeio de notáveis. É necessária uma rede consistente e sustentável, com fileiras de formação e pesquisa, orientada para dar resposta aos desafios societais, que permitem os avanços que nos capitalizam. Temos de o orientar para tal, definindo-o. Viciar na aplicação de inovação incremental é atrofiar para perder. Desbaratar pessoal qualificado no remedeio do imediato é um erro. Ser incauto é usar a galinha dos ovos de ouro para fazer canja, ou arroz de cabidela.
Docente do Ensino Superior e Presidente da Direção do SNESup
16 DE MARÇO DE 2017
00:00
Gonçalo Leite Velho
Diário de Notícias
No teor das propostas conhecidas há um marco que se conseguiu instaurar (graças também à ação do GP-PS), reorientando para a inserção na carreira. É um ponto de consenso à esquerda, que permite a consolidação de um sistema em envelhecimento. Algumas dúvidas do CDS-PP devem ser vencidas, a bem da defesa do interesse nacional. Sem um sistema científico estável e com condições, Portugal torna-se um país frágil. Olhar para os EUA é verificar a força das suas agências de Estado, fundamento do seu desenvolvimento. As questões de sustentabilidade implicam reforçar o consenso sobre a ciência, uma qualidade herdada de Adriano Moreira.
O PSD pode fazer a diferença fundamental, permitindo retirar algo de positivo de uma pasta que não lhe correu bem quando esteve no governo. A visão de valorização, com vencimentos competitivos a nível internacional (que existia no programa Investigador FCT), permite uma política de captação de talentos, impedindo a política de desvalorização e baixos salários de Manuel Heitor (pior, só os docentes de baixo custo propostos por um certo reitor).
O consenso alargado sobre o valor da ciência é por vezes quebrado por um lugar-comum que vem de tempos idos. Insiste-se num Portugal pobre, de nichos exclusivos. Um erro tão mais grave quanto o quadro de qualificação alargada que tem vindo a sair por culpa de tal ideia.
Pensar é vencer lugares-comuns. Como o de que o emprego científico deve ser precário para aumentar a produtividade. É falso. Veja-se o que diz a European Science Foundation. A precariedade é propensa a métricas. Reflete a procura pelo que permite alcançar o lugar estável. Tais métricas podem esconder uma produção estéril. Contudo, a ESF demonstra que os investigadores de carreira não só mantêm as dinâmicas de publicação como produzem com maior impacto social e económico, incluindo maior entrosamento na comunidade e influência nas decisões públicas. Em ciência a estabilidade é fundamental, permitindo uma maior e melhor produtividade.
Sabemos o que se fez de errado. Subverteram-se as bolsas (um apoio à formação) utilizando-as como instrumento de contratação. Um conjunto de interesses e de circunstâncias ditou que a contratação por fundos europeus se concentrasse na figura do bolseiro. Desvalorizou-se, precarizou-se e descapitalizou-se a Segurança Social, de tal forma que em breve teremos mesmo investigadores de nível mundial com reformas de valor mínimo.
Os estudos da OCDE apresentam Portugal como o pior nos níveis de precariedade dos mais qualificados, seja na economia em geral seja no espaço do ensino superior e ciência. Uma desvalorização da qualificação, que nos condena.
O estudo da ESF demonstra o problema maior: as economias do Sul da Europa possuem um crescimento em muito alimentado pelo crescimento do turismo (restauração, alojamento), o que contrasta com o dos países do Norte. O resultado é a emigração qualificada do Sul para o Norte, descapitalizando de investimento e acentuando o carácter periférico.
Há uma diferença entre economias que criam o smartphone e as que apenas desenvolvem aplicações para o smartphone. A capacidade do sistema tecnológico, científico e de ensino superior é a chave para as primeiras. Um ensino superior e ciência fortes são matéria que exige condições e recursos, possuindo outros agentes a nível global capacidade política e financeira para os fazer afirmar. É geopolítica.
Não podemos condenar o Sul da Europa à mera reprodução e aplicação do que é desenvolvido no Norte, ou à circulação em passeio de notáveis. É necessária uma rede consistente e sustentável, com fileiras de formação e pesquisa, orientada para dar resposta aos desafios societais, que permitem os avanços que nos capitalizam. Temos de o orientar para tal, definindo-o. Viciar na aplicação de inovação incremental é atrofiar para perder. Desbaratar pessoal qualificado no remedeio do imediato é um erro. Ser incauto é usar a galinha dos ovos de ouro para fazer canja, ou arroz de cabidela.
Docente do Ensino Superior e Presidente da Direção do SNESup
16 DE MARÇO DE 2017
00:00
Gonçalo Leite Velho
Diário de Notícias
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