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O Discurso Do Medo
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O Discurso Do Medo
Na abertura de uma conferência internacional sobre a importância da aparência, o reitor da Universidade de Kristianstad, na Suécia, referia como era fácil discriminar com base no aspeto exterior. Falando de si próprio, dizia que tendo o cabelo escuro, se deixasse crescer a barba e tivesse um ar menos arranjado, poderia ser considerado suspeito de algo ao viajar pela Europa. De facto, o responsável desta universidade sueca refletia sobre o que se está a passar no seu país neste momento. Há um par de semanas, um facto político abanou a Suécia, um dos estados mais estáveis do mundo. Pela primeira vez, ao fim de dois meses, caiu um governo por falta de consenso para a aprovação do orçamento de Estado, provocado pelas posições de um partido com simpatias de extrema-direita que ganhou terreno nas últimas eleições.
Funcionou o discurso do medo e o crescimento da população imigrante, com relevo para aqueles que têm origem em países islâmicos. Este fenómeno não aparece desgarrado na Suécia. Observe-se a restante Europa e veja-se como a França vê crescer o seu partido de extrema-direita ou a Alemanha se vê confrontada com manifestações contra a imigração de origem islâmica. Menciono o eixo franco-alemão, porque é também este eixo que deu força e coesão a uma construção europeia assente em valores humanistas durante décadas.
A Europa está a ficar refém do discurso do medo. Vê surgir nas fileiras do inimigo os seus próprios filhos e imagina em cada imigrante de um país islâmico um potencial terrorista. E, claro, não existindo outros sinais de pertença a este ou àquele grupo, é na aparência que se faz incidir parte da desconfiança que leva à discriminação. O aspeto conta na imagem que criamos de alguém e, também, no conceito que geramos em seu torno. Este é o passo mais fácil para levar à discriminação de seres humanos sem qualquer justificação.
O discurso do medo é tanto mais perigoso, quanto este traduz uma certa falência do modelo europeu de vivência que foi, durante tantos anos, propalado como o que deveria ser seguido em todo o mundo. O medo da diferença instalou-se, num contexto que deixou de garantir a proeminência dos povos ocidentais sobre os outros, como aconteceu durante os impérios coloniais ou neo-coloniais. E o que se pede aos europeus é que aprendam a viver com o diferente de forma humanista, num contexto de risco e imprevisibilidade. É neste contexto novo que as extremas-direitas europeias têm encontrado o seu nicho de crescimento. Porque o risco e a imprevisibilidade não são domináveis ou antecipáveis. Até hoje, estes fatores tinham sido sempre controlados por mão ocidental e não faziam parte das contas destes países. É preciso reformular e inovar, integrar e vencer o medo. É necessário não ceder à tentação de ver no risco e na imprevisibilidade uma possibilidade de retroceder na política para a paz que deve ser orientadora da política externa União Europeia como o foi tantas vezes. Ceder à tentação é providenciar espaço a movimentos extremistas que sabemos que acabarão mal.
Cátia Miriam Costa
Investigadora do Centro de Estudos Internacionais, ISCTE – IUL
17 Dezembro, 2014 00:02
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