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Mensagem por Admin Ter Jun 23, 2015 10:53 am

A atenção mediática que alguns casos de violência e bullying nas escolas têm suscitado nos últimos meses, lançou o alerta vermelho sobre o comportamento e a relação entre alunos ou entre alunos e docentes, questionando a segurança e a paz social nas escolas. O toque a rebate chega maioritariamente por gravações dos próprios alunos via redes sociais, como se estivéssemos condenados a ter nos agressores a melhor forma de vigilância ou denúncia deles mesmos. Uma contradição, um absurdo. As preocupações e dúvidas são legítimas e são parte do reflexo desta "escola-espelho" da sociedade em que se insere, um núcleo mas - ainda assim - apenas uma parte do centro nevrálgico do desinvestimento público na educação e na expectável adequação das respostas a problemas que não desaparecem quando a campainha da escola soa e os portões da escola se fecham. Seja para entrar ou sair, mesmo quando a sineta toca, a vida corre lá dentro.

A resposta veio, sob a forma militar, directamente das alterações legislativas do Conselho de Ministros de 11 de Junho. Quando o Ministério da Educação e Ciência permite que as Forças Armadas, neste caso os militares na reserva, façam vigilância nas escolas "com especial incidência nos recreios e junto das imediações da vedação escolar", percebe-se que o Governo entende que a educação nas escolas morre dentro das salas de aulas e que a noção de civismo, separação de poderes, adequação pedagógica e as mais elementares regras distintivas entre as forças de segurança pública e as forças de defesa interna não fazem parte dos manuais escolares. Sem ouvir ninguém e perante a perplexidade e estupefacção da Associação Nacional de Sargentos, Associação Sindical dos Profissionais da Polícia, Confederação Nacional das Associações de Pais e da Associação Nacional de Dirigentes de Agrupamentos de Escolas Públicas, violando o Estatuto Militar das Forças Armadas, dando uma imagem pobrezinha de todos e para todos. Mas, sobretudo, trazendo o submarino à tona: há oito anos que não são conhecidos concursos para assistentes operacionais, estando as escolas tomadas por pessoas não especializadas e sem formação, em modo carrossel, oriundas do Centro de Emprego para trabalhar apenas um ano na escola e que, mesmo que sejam consideradas válidas, não podem continuar a trabalhar. A visão pequena de que a escola se esgota na relação entre docente e aluno, ao arrepio da importância do pessoal não docente especializado como forma societária e equilibrada de desenvolvimento e segurança nos locais de ensino, abriu portas às Forças Armadas. É assim uma guerra onde vale tudo. Mesmo a falta de patente.

Imagino a ideia a tomar forma em Nuno Crato. Num país em que a área ardida em 2015 já duplicou em relação ao ano transacto, quando parte da população clama pela presença dos militares sem ocupação permanente nas florestas em altura de fogos, por que não espetá-los em pequenas tranches para conter os fogos escolares, disseminados pelas escolas com o seu passado fardado? Terá merecido aplauso. Acontece que uma escola não é uma floresta apesar das árvores que lá crescem. Nada tendo contra os militares (contemporâneos, na reserva ou "vintage"), a sua inclusão nas escolas como elementos dissuasores do que quer que seja - ainda que numa perspectiva de complementaridade com o programa "Escola Segura" da PSP - é encaminhar a educação do país para a ideia de que a escola e a sociedade civil não são capazes de lidar com os seus próprios dilemas e assegurar o justo equilíbrio entre o que não é igual.

Permitir que militares na reserva substituam pessoas com formação adequada para um desempenho pedagógico nas escolas é como consentir que tarólogos interfiram no desenho das metas orçamentais do Governo. Disfarça a falta de investimento de quase uma década em pessoal especializado mas está longe de ser congruente. Pressupor que pessoas transportadoras de valores securizantes se possam alongar em distensão para vigilantes obreiros da paz social nas escolas, é um exercício de adivinhação e uma inversão dos termos. Como se os alunos, antes de responder às perguntas, não conseguissem ler os enunciados. E, então, desatassem a atirar para o ar.

23.06.2015
MIGUEL GUEDES
Jornal de Notícias
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