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A dor em Espanha

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Mensagem por Admin Ter Nov 17, 2015 1:39 pm

Espanha é a mais recente bandeira da austeridade e das reformas estruturais da Zona Euro. A sua economia cresceu durante oito trimestres consecutivos, ganhando impulso e superando o resto da união monetária. O crescimento das exportações tem acompanhado o da Alemanha; o desemprego baixou em mais de um milhão de pessoas em dois anos; o investimento está a crescer; e a produção industrial aumentou 5% nos últimos 12 meses.

Mas a recuperação de Espanha não é exactamente o que parece, e é difícil provar que os progressos do país são o resultado da austeridade e das reformas.
 
Na verdade, longe de se adequar à habitual narrativa da austeridade - segundo a qual a consolidação orçamental reanima a confiança das empresas e, portanto, o investimento e a criação de emprego - o regresso de Espanha ao crescimento reflecte, em parte, a flexibilização da austeridade desde o início de 2014. O país tem resistido à pressão da Comissão Europeia para tomar medidas mais agressivas para reduzir o seu défice que, em 5,9% do PIB, foi o terceiro mais elevado da União Europeia no ano passado.
 
Da mesma forma, não há provas de que as reformas estruturais têm estimulado a recuperação de Espanha. É verdade, a OCDE relata que os mercados espanhóis de produtos e serviços estão mais liberalizados do que estavam antes da crise; mas o país não fez mais progressos do que a Itália, cujas exportações têm um desempenho fraco.
 
Além disso, embora os dados da OCDE apontem para uma modesta desregulamentação do mercado de trabalho de Espanha, há poucas evidências que relacionem os mercados de trabalho desregulamentados com a melhoria da competitividade e das exportações. As exportações da Alemanha, por exemplo, têm um forte desempenho, apesar de o mercado de trabalho do país ser mais bem regulamentado do que o de França, Itália ou Espanha.
 
Em qualquer caso, a recuperação de Espanha é menos robusta do que parece. Mesmo que a economia espanhola cresça 3% em 2015, e 2,5% em 2016, não voltará aos níveis pré-crise antes de 2017. Se a economia tivesse crescido 2% ao ano desde 2008 - ou seja, metade da sua taxa de crescimento média entre 1999 e 2007 - seria maior agora, em um quinto. Além disso, o consumo e o investimento ainda estão 12% abaixo, e não é provável que recupere esse terreno perdido antes de 2020.
 
O abismo entre o PIB e a procura interna pode ser explicado, em grande parte, pelo colapso das importações que, no segundo trimestre de 2015, estavam 15% abaixo dos níveis do último trimestre de 2007, devido ao declínio dos padrões de vida, ao desemprego em massa e à diminuição do investimento. Surpreendentemente, a produção industrial ainda está mais baixa do que estava no pico da crise em 2009.  
 
Enquanto as exportações espanholas aumentaram 18% desde o quarto trimestre de 2007, isto reflecte, em grande medida, o facto de os preços das exportações espanholas terem subido muito menos do que os de outros grandes países da União Europeia. E o crescimento das exportações espanholas tem sido potenciado por sectores de baixo valor acrescentado e sensíveis ao nível dos preços como combustíveis, alimentos e matérias-primas, e não pela subida das empresas espanholas na cadeia de valor.
 
O maior motor do crescimento espanhol durante o ano passado foi o aumento do consumo privado, impulsionado pela queda do desemprego e pela subida dos salários reais. Ainda que sejam boas notícias, requerem algum contexto.  
 
Para começar, a queda da taxa de desemprego ao longo dos últimos dois anos inclui as 300 mil pessoas que deixaram a força de trabalho. A maioria dos postos de trabalho criados durante este período foi em serviços de baixa remuneração, sobretudo o turismo, enquanto o emprego global continua 14% abaixo do seu pico pré-crise - o pior desempenho da Zona Euro, com excepção da Grécia.
 
Ao mesmo tempo, o aumento dos salários reais está a ser impulsionado, em parte, por factores temporários. Embora os salários nominais tenham crescido, o aumento dos salários reais reflecte o deslize em direcção à deflação. Com os agentes económicos a adaptarem-se à inflação mais baixa, o crescimento dos salários reais deverá cair. De facto, o crescimento dos salários nominais abrandou acentuadamente no segundo trimestre deste ano. 
 
A inflação baixa pode ter ajudado a impulsionar a competitividade dos preços das exportações espanholas, mas está longe de ser benigna. O PIB nominal é menor do que era há sete anos, o que significa que o serviço da dívida está a ser feito a partir de um rendimento estagnado ou em declínio. O nível global da dívida de Espanha (governo, famílias, empresas financeiras e empresas não financeiras) está pouco abaixo do seu pico de 2012 e ainda muito mais elevado do que em 2008.
 
Há muitas razões para se estar céptico acerca das perspectivas de crescimento de Espanha. Primeiro, a inflação deverá manter-se muito baixa, com muitos mais anos de desemprego elevado a pesar sobre os preços e o Banco Central Europeu pouco disposto a prosseguir com medidas de flexibilização monetária agressivas para os fazer subir (o que dificulta a redução do valor real da dívida do país).
 
Em segundo lugar, com a baixa inflação a elevar os custos dos empréstimos reais, o capital e a mão-de-obra qualificada fluem para países mais fortes onde a inflação é maior. O Governo espanhol não tem os fundos necessários para contrariar este efeito com os gastos públicos, e a Zona Euro carece de mecanismos fiscais para compensar os Estados-membros mais fracos.
 
Em terceiro lugar, a recuperação da procura interna vai levar as importações a subir mais rapidamente do que as exportações. Isso vai renovar o défice em conta corrente e piorar a já débil posição das disponibilidades líquidas sobre o exterior de Espanha.
 
Em quarto lugar, a população espanhola em idade activa deverá encolher rapidamente. Com uma elevada taxa de desemprego, isso não parece ser um problema; mas normalmente leva a um fraco crescimento económico que compromete as perspectivas de redução da dívida de um país.
Em quinto lugar, a combinação de dados demográficos desfavoráveis ??e uma grande quantidade de casas vazias irá impedir uma forte recuperação do mercado imobiliário. Como resultado, a actividade do sector da construção deverá estagnar em níveis baixos.
 
Por fim, Espanha deverá entrar na próxima recessão mal tendo recuperado da anterior, com altos níveis de endividamento público e privado e uma taxa de desemprego bem acima dos níveis pré-crise. Dada a escassez de instrumentos políticos disponíveis para impulsionar a procura doméstica, é provável que passe por outra recessão profunda.
 
A história da recuperação de Espanha não é bem "mentiras, malditas mentiras e estatísticas"; mas também não é a narrativa inspiradora de coragem e reivindicação políticas que muitos observadores fazem parecer. A realidade é que Espanha enfrenta agora o desafio de aumentar a produtividade num contexto de inflação baixa, elevados níveis de dívida interna e externa, políticas macroeconómicas restritivas e grandes desafios demográficos. E essa é uma história que não acaba necessariamente bem.
 
Simon Tilford é director-adjunto do Centro para a Reforma Europeia.
 
Direitos de Autor: Project Syndicate, 2015.
www.project-syndicate.org
Tradução: Rita Faria 

16 Novembro 2015, 20:00 por Simon Tilford
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