Exportar a sala de aula

Temos à partida condições muito competitivas, ainda antes de falarmos de ensino e instituições, a saber, um clima invejável durante todo o ano, sobretudo quando comparado com a Europa central e nórdica, níveis de segurança para o comum do cidadão elevados quando nos comparamos com outros países e outros continentes, um custo de vida, em contexto europeu, muito competitivo e somos ainda uma sociedade que acolhe e trata bem os visitantes. Poderemos ser batidos por um ou outro país em algum destes itens, mas no conjunto a nossa proposta pode ser quase imbatível.

Olhando para este negócio exportador através da captação de alunos estrangeiros (poderemos também olhar para a realização de cursos no exterior), há dois campeonatos distintos. Um, mais exigente, assenta na captação de alunos ‘full-time', que pagam as correspondentes propinas. E pode gerar receitas interessantes. Imagine-se um aluno que vem cá fazer um mestrado de um ano. Entre propinas, alojamento e gastos com a estadia chega-se com facilidade a 10.000 euros num ano. Imagine-se agora que eram 10,000 alunos (não chegam a 3% dos estudantes do ensino superior) e teríamos 100 milhões. O outro campeonato é o dos programas de intercâmbio, este já sem propinas mas mantendo o benefício da estadia embora, também fomente um fluxo contrário, pois haverá também alunos portugueses no percurso contrário. 

A captação de alunos estrangeiros oferece ainda uma alternativa de crescimento às instituições de ensino superior perante a redução inexorável do número de alunos decorrente do envelhecimento da população. Promove também um ambiente mais internacional nas nossas universidades, com as vantagens em termos de vivência para os nossos alunos, em particular para aqueles que não têm possibilidades económicas de passar alguns meses a estudar no estrangeiro. 

Para o crescimento desta actividade exportadora há mudanças em curso. Recentemente, o Governo deu um passo importante e que vinha sido inexplicavelmente adiado há anos, a livre captação pelas instituições universitárias de alunos estrangeiros nas suas licenciaturas (praticando uma propina livre e sem o crivo de se passar pelo sistema de acesso ao ensino superior) o que irá estender ao 1º ciclo a oferta internacional até agora limitada a mestrados e doutoramentos. Por outro lado, investidores começam a movimentar-se no sentido de desenvolver projectos imobiliários de alojamento para estudantes, com serviços de apoio adequados, carência evidente nas nossas principais cidades. Igualmente se nota um esforço de muitas Escolas no sentido de aumentarem a oferta de programas em língua inglesa, requisito importante para o acolhimento de estudantes. Este esforço deveria ser sinalizado a nível de comparticipação pública. 

Mas continuam a existir várias limitações, como a dificuldade de obtenção de vistos por parte de alunos fora da UE, devendo a rede consular ser bem mais extensa (com a inclusão de outras entidades com representação externa) e uma ligação bem mais directa com as instituições universitárias na validação dos potenciais alunos e agilização da burocracia. De igual modo, seria interessante ver o país e as cidades envolvidas num esforço de promoção do destino enquanto local de estudo, valorizando os atractivos destacados no início deste texto. Trata-se de um ‘cluster' que mereceria outra atenção e investimento a nível de políticas públicas. 

No fim, fica o problema mais geral do corte ao financiamento das instituições universitárias. E o que vemos, por exemplo, a nível das Escolas de Gestão no que concerne à sua progressão nos ‘rankings' e acreditações internacionais, deveria merecer apoio acrescido. Na verdade, poderemos sempre atrair alunos estrangeiros com Escolas de média qualidade, mas com Escolas com maior reputação, podemos atrair volume com maior qualidade, incrementando o nosso reconhecimento internacional, com benefício para múltiplas actividades económicas.

António Gomes Mota
08/05/14 00:05