Portugal tem futuro (passa por Sines e pelo Panamá)

Eu não percebo nada de barcos, confundo bombordo com estibordo e popa com proa. Também não percebo nada de economia, aliás, nem uma conta de dividir sei fazer. Mas sei olhar para um mapa: Sines, a terra do meu velho, está em linha recta com o Canal do Panamá; depois da finalização (2014) das obras faraónicas que estão a alargar o canal entre o Atlântico e o Pacífico, Sines será o porto europeu mais próximo da China para aqueles navios que parecem arranha-céus na horizontal - os pós-panamax, 12.000 TEUS. Por outras palavras, está em curso uma mudança radical nas rotas marítimas do mundo inteiro, e Sines está mesmo no centro deste maremoto comercial. A China e todos os outros mastodontes de olhos amendoados ficarão mais próximos da Europa através do eixo Panamá-Sines.

Não por acaso, Singapura já investiu seríssima grana em Sines. Não por acaso, o Presidente do Panamá fez ontem uma visita de estado a Portugal. Tema de conversa entre Ricardo Martinelli e Cavaco Silva? A resposta pode surpreender os mais distraídos: o Panamá já elegeu Sines como o porto europeu prioritário; há um ano, a Autoridade para o Canal do Panamá e a Administração do Porto de Sines celebraram um acordo que formalizou precisamente a prioridade alentejana. Sim, é verdade. Se tivermos juízo, se conseguirmos equipar Sines (ex.: ligação ferroviária sem paragens até França), o futuro de Portugal será mais risonho quando o eixo Panamá-Sines estiver a carburar em pleno.

Mas já repararam que este assunto não gera conversa em Portugal? Estamos perante uma oportunidade estratégica única, mas Sines não tem nem 10% da atenção que merecia. Ontem, a visita do Presidente do Panamá foi uma mera nota de rodapé na "agenda". Além de estranho, isto é um pouco triste. Está em curso uma mudança radical no mapa das rotas mundiais e Portugal pode ser um dos beneficiados, mas a nossa elite não discute o tema em profundidade. Tal como não discute o nosso potencial para abastecer a Europa de gás . Tal como não discute a expansão da nossa zona económica exclusiva. No fundo, voltamos sempre ao desprezo queirosiano que os portugueses sentem por Portugal.  Por razões familiares, escrevo há anos sobre Sines e oiço há anos o mesmo comentário "ó Henrique, Sines nunca irá a lado nenhum, não tem hipótese".