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Olhem que não, olhem que não, senhores comentadores
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Olhem que não, olhem que não, senhores comentadores
Os comentadores políticos que acham que o PCP teve de engolir um grande sapo para fazer a atual aliança com o PS (e é de uma aliança que se trata, quer o PCP queira quer não queira) deviam ver o famoso debate de 1975 entre Soares e Cunhal de 1975.
Quando Cunhal diz a Soares "olhe que não, senhor doutor, olhe que não", não lhe está a dizer que é impossível haver um entendimento entre as duas forças. Muito pelo contrário: Cunhal passou todo o santo debate a tentar puxar Soares para uma aliança com as "forças populares, revolucionárias e democráticas" - nas quais evidentemente incluía o seu partido - por oposição às alianças que dizia que o PS estava a fazer com as "forças reacionárias".
Cunhal fez nesse debate prognósticos que se revelariam completamente acertados: que o PS ao entender-se à direita e desprezando a esquerda acabaria "atropelado" pela direita (e o PS teve o seu pior resultado de sempre, 21%, depois de uma aliança com o PSD, resultado do qual levaria dez anos a recuperar) e que acabaria a fazer alianças com o CDS (o que aconteceu).
Quer dizer: historicamente foi o PCP a tentar puxar o PS para alianças e foi o PS a recusar essas alianças. E quando houve entendimentos, foi com o PS em estado de necessidade (para eleger Soares presidente da República ou para eleger Sampaio presidente de Lisboa).
Portanto, é naturalíssimo que o histórico do PCP Albano Nunes (um porta-voz da mais estrita ortodoxia comunista, sobretudo em questões de política internacional) diga, como o fez numa pequena entrevista ao DN neste fim de semana, que Álvaro Cunhal aprovaria a "posição conjunta". O que Albano Nunes não disse é que não só Cunhal aprovaria a aliança, como também todos os que começaram a sair do PCP (muitos em direção ao PS) quando o Muro de Berlim lhes caiu em cima.
Dito de outra forma: no PCP o acordo acaba por ser natural, e isso viu-se no congresso de Almada. A "posição conjunta" não foi uma imposição de cima para baixo que as bases aceitaram contrariadas. Pelo contrário: a direção do partido, com Jerónimo de Sousa à cabeça, percebeu, por emanação da base para o topo - e também das estruturas sindicais e autárquicas do partido -, que era completamente impossível o partido ver-se outra vez na posição de aliado objetivo da direita, como aconteceu em 2011, quando da queda de Sócrates resultou uma maioria PSD-CDS.
É errado dizer que os comunistas estão a engolir sapos. O PCP faz política e sabe que fazer política é - acima de tudo - mudar a realidade. Agora está a ter um poder que não tinha desde 1975 - quando Soares dizia a Cunhal "olhe que não, senhor doutor, olhe que não". Oiçam no PS Francisco Assis ou Sérgio Sousa Pinto e depois digam-me quem está a engolir sapos.
08 DE DEZEMBRO DE 2016
00:00
João Pedro Henriques
Diário de Notícias
Quando Cunhal diz a Soares "olhe que não, senhor doutor, olhe que não", não lhe está a dizer que é impossível haver um entendimento entre as duas forças. Muito pelo contrário: Cunhal passou todo o santo debate a tentar puxar Soares para uma aliança com as "forças populares, revolucionárias e democráticas" - nas quais evidentemente incluía o seu partido - por oposição às alianças que dizia que o PS estava a fazer com as "forças reacionárias".
Cunhal fez nesse debate prognósticos que se revelariam completamente acertados: que o PS ao entender-se à direita e desprezando a esquerda acabaria "atropelado" pela direita (e o PS teve o seu pior resultado de sempre, 21%, depois de uma aliança com o PSD, resultado do qual levaria dez anos a recuperar) e que acabaria a fazer alianças com o CDS (o que aconteceu).
Quer dizer: historicamente foi o PCP a tentar puxar o PS para alianças e foi o PS a recusar essas alianças. E quando houve entendimentos, foi com o PS em estado de necessidade (para eleger Soares presidente da República ou para eleger Sampaio presidente de Lisboa).
Portanto, é naturalíssimo que o histórico do PCP Albano Nunes (um porta-voz da mais estrita ortodoxia comunista, sobretudo em questões de política internacional) diga, como o fez numa pequena entrevista ao DN neste fim de semana, que Álvaro Cunhal aprovaria a "posição conjunta". O que Albano Nunes não disse é que não só Cunhal aprovaria a aliança, como também todos os que começaram a sair do PCP (muitos em direção ao PS) quando o Muro de Berlim lhes caiu em cima.
Dito de outra forma: no PCP o acordo acaba por ser natural, e isso viu-se no congresso de Almada. A "posição conjunta" não foi uma imposição de cima para baixo que as bases aceitaram contrariadas. Pelo contrário: a direção do partido, com Jerónimo de Sousa à cabeça, percebeu, por emanação da base para o topo - e também das estruturas sindicais e autárquicas do partido -, que era completamente impossível o partido ver-se outra vez na posição de aliado objetivo da direita, como aconteceu em 2011, quando da queda de Sócrates resultou uma maioria PSD-CDS.
É errado dizer que os comunistas estão a engolir sapos. O PCP faz política e sabe que fazer política é - acima de tudo - mudar a realidade. Agora está a ter um poder que não tinha desde 1975 - quando Soares dizia a Cunhal "olhe que não, senhor doutor, olhe que não". Oiçam no PS Francisco Assis ou Sérgio Sousa Pinto e depois digam-me quem está a engolir sapos.
08 DE DEZEMBRO DE 2016
00:00
João Pedro Henriques
Diário de Notícias
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