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A aliança inglesa
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A aliança inglesa
Como em todas as Democracias de modelo europeu, a batalha será travada à volta dos indecisos. Para os outros dois terços, segue-se a regra de Maquiavel: os amigos já cá estão, não vale a pena gastar tempo e dinheiro; os inimigos, há que derrota-los ou comprá-los.
Resta saber para onde irão os indecisos.
O Tratado de Windsor foi firmado em 1386 entre os reinos de Portugal e da Inglaterra e, segundo as vulgares enciclopédias, é considerado como o tratado internacional mais antigo ainda em vigor (apesar de haver referências a outro tratado de Windsor, firmado em 1175 entre a Inglaterra e a Irlanda). Ainda recentemente, na sequência de uma reunião com Angela Merkl, António Costa, o nosso Primeiro-Ministro, evocou esse tratado, como forma de apoio moral às diligências para a manutenção do Reino Unido no seio da Comunidade Europeia.
Dir-se-ia uma continuação do “Grande Jogo”, imortalizado por Rudiard Kipling, mas às avessas: em vez de ter como objetivo o domínio das Índias pelos ingleses, era a tentativa de integração da Inglaterra pelo Continente.
Naturalmente, a boa intenção de António Costa falhou. Não se pode esperar que uma estratégia secular seja alterada por um problema que, do ponto de vista britânico, é meramente conjuntural.
A questão da ligação do Reino Unido à então Comunidade Económica Europeia (CEE), nascida em 1957, vem de longe. A sua primeira reação foi de oposição: assim nasceu em 1960 a EFTA (European Free Trade Association), congregando sete países da periferia europeia (por isso chamados os outer seven), entre eles Portugal. Com o passar dos tempos, a EFTA naturalmente desmoronou-se, não restando ao Reino Unido outra solução que não a adesão à UE – cheia de reticências, claro.
Obviamente, houve de ambos os lados do Canal da Mancha quem se opusesse. Nada mais natural: não é impunemente que se altera a tradição do magnífico isolamento (spendid isolation) que foi a base da política externa inglesa até à I Guerra Mundial, e cujo espírito ainda hoje perdura.
Mas houve pior: para os mais céticos, a entrada do Reino Unido na UE estava prenhe de reservas mentais por parte dos insulares. Os adeptos da teoria da conspiração iam mais longe: tratava-se de uma manobra americana para introduzir o cavalo de troia britânico na Comunidade, por forma a entravar o processo de integração europeia. Por outras palavras, de deitar areia na engrenagem. Assim o tandem anglo-saxónico, que tão bem trabalhara no século XX, teria a sua continuidade.
De facto, os alinhamentos sistemáticos da Inglaterra com os Estados Unidos (Iraque I e II, Afeganistão, Europa de Leste), ao arrepio de uma política comum europeia, apontavam nesse sentido. Mas, a este nível, nada é simples, como preto no branco; a cada um a sua interpretação.
Certo é que o Reino Unido sempre pôs os assuntos tidos como essenciais acima de tudo; aliás, a nossa História está cheia de bons exemplos, desde o Ultimatum à crise do porto da Beira… Ou seja, o Tratado de Windsor tanto pôde ser invocado durante a I e II Guerras Mundiais, como ignorado quando logo depois. Em tempos de políticas europeias comuns, a referência de António Costa a um tratado bilateral, por muito venerando que seja, tem mais de romântico e nostálgico do que de eficaz; mas caiu bem!
Mas talvez o mais importante de tudo é saber o que se passa na cabeça do britânico comum. É que na Inglaterra a Democracia está bem enraizada, e lá não é fácil vender uma política como um sabonete.
E o pensamento profundo de um inglês pode talvez ser resumido numa frase de um amigo meu, puro representante da Inglaterra profunda. Quando lhe perguntei qual era o impacto do Túnel da Mancha, respondeu sem pestanejar: se fosse eu que mandasse, tapava aquele buraco!
Claro que os tempos mudaram. Os Estados Unidos estão cada vez menos anglo-saxónicos (vejam-se, por exemplo, as altas figuras do Estado e os altos comandos das Forças Armadas). Vai desaparecendo o conceito de WASP (white, anglo-saxon, protestant) como condição necessária à ascensão social, pelo que um dos lados do tal tandem se vai distanciando cada vez mais do Atlântico para o Pacífico e para o seu hemisfério, ou seja, para as Caraíbas e América Central e do Sul (aliás, uma tendência só interrompida no século XX).
E na Britania, que já não domina os mares?
Com os últimos desenvolvimentos, a decisão caberá ao povo britânico, através de um anunciado referendo. As últimas sondagens davam um resultado curioso: o Reino Unido estava, grosso modo, dividido em três terços: um contra, outro a favor, e o terceiro de indecisos.
Como em todas as Democracias de modelo europeu, a batalha será travada à volta dos indecisos. Para os outros dois terços, segue-se a regra de Maquiavel: os amigos já cá estão, não vale a pena gastar tempo e dinheiro; os inimigos, há que derrota-los ou comprá-los.
Resta saber para onde irão os indecisos.
Falta assim prever quem ganha: se a Inglaterra profunda ou os novos pragmáticos. Mas o mais certo é ninguém abdicará de ser inglês…
Vai uma aposta?
Por Nuno Santa Clara
Barreiro
21.02.2016 - 19:38
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