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Ó velho, vai mas é morrer!
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Ó velho, vai mas é morrer!
Alguém disse um dia que o Diabo se esconde nos pormenores e Freud bem explicava que “nada se faz por acaso”
Retirar palavras ou frases do contexto é sempre perigoso. É como o Twitter – nem todos têm capacidade de síntese para conseguir expressar uma ideia e explicá-la e justificá-la em 140 caracteres, ou então tudo se resume a desabafos, frases sem consequência ou, como é comum, insultos, raivas e ódios que, se obrigassem a mais ponderação e análise, talvez nunca saíssem, explosivamente, para as redes sociais, e daí para o mundo inteiro.
Aqui há dias comentou-se muito uma frase de Lagarde (houve também quem a atribuísse a Cavaco Silva) que se tornou “viral” (odeio o termo!) em que supostamente teriam expressado que “o aumento do número de velhos, decorrente do aumento da longevidade, era um problema para a segurança social”. Dito assim é chocante.
Porventura ainda não chegámos a tais níveis de desumanidade e as frases, nos devidos contextos explicativos, terão seguramente outro sentido, até diametralmente oposto em termos éticos. Mas o que ficou, na superficialidade e na falta de rigor das redes sociais, é que Lagarde e Cavaco “querem dar uma injecção atrás da orelha aos idosos”.
Alguém disse um dia que o Diabo se esconde nos pormenores e Freud bem explicava que “nada se faz por acaso”. Ao ver esta pequena polémica instalada num país que parece ter poucas coisas importantes para debater, recordei-me de um anúncio que há um par de anos passou na rádio e em que, resumidamente, se contava a historieta de uma adorável criancinha que tinha de fazer um trabalho escolar sobre o Dia D. Quando uma voz masculina já idosa, no jingle, se prestava a explicar tudo ao miúdo, e até dizia que lhe iria fazer um esquema do desembarque das tropas aliadas na Normandia –, o pequeno monstro replicava, num tom repleto de pesporrência e de arrogância: “Ó avô! Para quê, se tenho o atlas do … (por pudor omito o nome da publicação).”
A voz infantil nem sequer dizia “Que bom, avô, até podemos ver juntos uma coisa que tenho aqui”, ou “Que engraçado, avô, já que fala nisso até tenho aqui uma publicação que o avô vai adorar ver”, ou até “Obrigado, avô, e por acaso até existe um atlas…” Não! A criatura simplesmente descartava o avô com despacho e eficiência. O que é que interessaria na realidade a esse miúdo, sequioso de informação mas estúpido no que se refere ao conhecimento, ter olhos e ouvidos para o que um velho lhe pudesse transmitir? Este jovem cidadão estava-se positivamente nas tintas para o que a sabedoria pudesse representar, nem nunca provavelmente entenderá que esta só se adquire com a experiência e que sem ela a informação é mero lixo, superficial e inoperante.
É triste que, para promover um atlas ou seja o que for, se tivesse de humilhar pessoas e mostrar que é através de espertezas saloias que se chega aos objectivos. Dizer explicitamente às crianças que aquilo que o avô (ou qualquer pessoa de idade) lhes pode transmitir é simples porcaria relativamente a uma publicação, por melhor que esta seja, é um desrespeito, uma enormidade e uma clara demonstração de mediocridade intelectual. Não foi para isto que se fez o desembarque na Normandia e o Dia D!
A menos que a culpa seja minha, por porventura não ter sentido de humor e ter entendido tudo mal, e afinal os avôs, os netos, os pais, os especialistas de marketing, o povo e demais estejam todos num grande gozo, sejam muito reinadios e vivamos num país de brincalhões, de porreiraços… Para mim, na altura e ainda agora, foi um exemplo acabado do mau gosto, de desumanidade e do “fartai vilanagem”.
Fica então um conselho para esse menino e para todos os que olham para os velhos como fardos, inoperantes, incapazes porque não dominam as redes sociais e não têm página no facebook, instagram ou snapchat, ou porque demoram mais tempo a atravessar a rua, engonhando o trânsito: para a próxima, puto, manda o avô comprar ele o atlas. Já que o velho não serve para mais nada, ao menos que te financie os prazeres hedónicos, para depois teres mais tempo para a consola. Já agora, pede ao velho que te traga também dois pacotes de gomas e três cromos da Violetta...
Pediatra
Escreve à terça-feira
Mário Cordeiro
18/08/2015 08:00
Jornal i
Retirar palavras ou frases do contexto é sempre perigoso. É como o Twitter – nem todos têm capacidade de síntese para conseguir expressar uma ideia e explicá-la e justificá-la em 140 caracteres, ou então tudo se resume a desabafos, frases sem consequência ou, como é comum, insultos, raivas e ódios que, se obrigassem a mais ponderação e análise, talvez nunca saíssem, explosivamente, para as redes sociais, e daí para o mundo inteiro.
Aqui há dias comentou-se muito uma frase de Lagarde (houve também quem a atribuísse a Cavaco Silva) que se tornou “viral” (odeio o termo!) em que supostamente teriam expressado que “o aumento do número de velhos, decorrente do aumento da longevidade, era um problema para a segurança social”. Dito assim é chocante.
Porventura ainda não chegámos a tais níveis de desumanidade e as frases, nos devidos contextos explicativos, terão seguramente outro sentido, até diametralmente oposto em termos éticos. Mas o que ficou, na superficialidade e na falta de rigor das redes sociais, é que Lagarde e Cavaco “querem dar uma injecção atrás da orelha aos idosos”.
Alguém disse um dia que o Diabo se esconde nos pormenores e Freud bem explicava que “nada se faz por acaso”. Ao ver esta pequena polémica instalada num país que parece ter poucas coisas importantes para debater, recordei-me de um anúncio que há um par de anos passou na rádio e em que, resumidamente, se contava a historieta de uma adorável criancinha que tinha de fazer um trabalho escolar sobre o Dia D. Quando uma voz masculina já idosa, no jingle, se prestava a explicar tudo ao miúdo, e até dizia que lhe iria fazer um esquema do desembarque das tropas aliadas na Normandia –, o pequeno monstro replicava, num tom repleto de pesporrência e de arrogância: “Ó avô! Para quê, se tenho o atlas do … (por pudor omito o nome da publicação).”
A voz infantil nem sequer dizia “Que bom, avô, até podemos ver juntos uma coisa que tenho aqui”, ou “Que engraçado, avô, já que fala nisso até tenho aqui uma publicação que o avô vai adorar ver”, ou até “Obrigado, avô, e por acaso até existe um atlas…” Não! A criatura simplesmente descartava o avô com despacho e eficiência. O que é que interessaria na realidade a esse miúdo, sequioso de informação mas estúpido no que se refere ao conhecimento, ter olhos e ouvidos para o que um velho lhe pudesse transmitir? Este jovem cidadão estava-se positivamente nas tintas para o que a sabedoria pudesse representar, nem nunca provavelmente entenderá que esta só se adquire com a experiência e que sem ela a informação é mero lixo, superficial e inoperante.
É triste que, para promover um atlas ou seja o que for, se tivesse de humilhar pessoas e mostrar que é através de espertezas saloias que se chega aos objectivos. Dizer explicitamente às crianças que aquilo que o avô (ou qualquer pessoa de idade) lhes pode transmitir é simples porcaria relativamente a uma publicação, por melhor que esta seja, é um desrespeito, uma enormidade e uma clara demonstração de mediocridade intelectual. Não foi para isto que se fez o desembarque na Normandia e o Dia D!
A menos que a culpa seja minha, por porventura não ter sentido de humor e ter entendido tudo mal, e afinal os avôs, os netos, os pais, os especialistas de marketing, o povo e demais estejam todos num grande gozo, sejam muito reinadios e vivamos num país de brincalhões, de porreiraços… Para mim, na altura e ainda agora, foi um exemplo acabado do mau gosto, de desumanidade e do “fartai vilanagem”.
Fica então um conselho para esse menino e para todos os que olham para os velhos como fardos, inoperantes, incapazes porque não dominam as redes sociais e não têm página no facebook, instagram ou snapchat, ou porque demoram mais tempo a atravessar a rua, engonhando o trânsito: para a próxima, puto, manda o avô comprar ele o atlas. Já que o velho não serve para mais nada, ao menos que te financie os prazeres hedónicos, para depois teres mais tempo para a consola. Já agora, pede ao velho que te traga também dois pacotes de gomas e três cromos da Violetta...
Pediatra
Escreve à terça-feira
Mário Cordeiro
18/08/2015 08:00
Jornal i
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